Onde está a pintura de teto, com moldura oval, assente em madeira?
Como foi possível o Pelouro do Urbanismo, do Município de Braga, permitir a demolição do interior desta casa, apesar de os elementos da arquitetura original estarem devidamente sinalizado no processo e exigirem um trabalho de reabilitação minucioso e qualificado?
“Os Anjinhos estão à Chuva? Casa nº 161 da Rua de S. Vicente” foi o título do entre-aspas publicado nesta mesma página, no dia nove de setembro, em que partilhamos alertas junto dos responsáveis pelo Património e Urbanismo na Câmara Municipal de Braga, bem como a garantia, dada por técnicos da Divisão de Gestão Urbanística, de que os elementos da arquitetura original, de importância histórico-patrimonial, seriam preservados, nomeadamente a pintura com moldura oval assente em madeira do teto e, também, os restantes elementos da arquitetura da época. Relembramos que esta casa consta do Mappa das Ruas de Braga (1750).
A casa nº 161 mereceu a atenção da ASPA, desde 2016, pelo facto de se tratar de um edifício barroco, que apresenta uma pintura de teto com moldura oval, bem como outros elementos da arquitetura desse época (teto em masseira, senhorinhas e escadas interiores de granito, etc.). Foi um dos motivos que conduziu ao pedido de classificação da Rua de S. Vicente, apresentado pela ASPA, em 2017, junto da anterior tutela do património, encaminhado para o Município de Braga para eventual classificação como conjunto de interesse concelhio. Classificação que não se concretizou.
O alerta da ASPA, junto do Senhor Presidente e do Senhor Vereador do Urbanismo, corre desde 26 de agosto, altura em que foi colocado um andaime junto a esta casa do séc. XVIII, e retirado o telhado e beiral, pelo que alertámos para o risco de perda de património e solicitámos resposta a várias questões, com destaque para as medidas preventivas adotadas no sentido da salvaguarda, in situ, da pintura oval de teto. Também solicitámos dados relativos ao projeto de arquitetura aprovado, uma vez que, nessa altura, o Aviso da obra não estava afixado. Seguiu-se outro e-mail, a 5 de setembro, quando retiraram a estrutura de madeira do teto do piso 2, deixando a pintura do séc. XVIII sob ação direta da chuva.
Dois dias depois da publicação do referido entre-aspas constatámos o início da retirada do soalho de madeira do piso 2, que incluía a pintura oval de teto do piso 1, pelo que enviámos novo e-mail, a 11 de setembro, alertando novamente para o risco de perda de património e solicitando a consulta dos elementos integrantes do dossiê relativo ao licenciamento, com o Alvará nº 240/2024, entretanto afixado, que tem em vista Obras de Alteração, Reconstrução e Ampliação, aprovadas por Despacho de 16/01/2023.
Três e-mails enviados em agosto e setembro, os últimos com imagens da demolição em curso. A que não obtivemos resposta!
O projeto de arquitetura previa demolir a estrutura da casa, que incluía tetos em madeira de dois salões do piso 2, um deles com a pintura oval e o outro em masseira?
Em novembro, quando já só restava a fachada desta casa do século XVIII (um dos últimos elementos construtivos pré-existentes, e sobreviventes aos trabalhos de demolição realizados), enviámos novo e-mail, aos responsáveis municipais pelo Património e pelo Urbanismo, no sentido de obter o cabal esclarecimento de questões relativas à obra aprovada pelo Pelouro do Urbanismo, em janeiro de 2023, de que destacamos:
- Quais as condicionantes impostas, no âmbito do licenciamento, para garantir a preservação, in situ, da pintura de teto com moldura oval, assente em madeira (séc. XVIII), bem como dos restantes elementos da arquitetura original?
- Onde se encontra a pintura de teto com moldura oval, atendendo à sua importância histórico-patrimonial?
- Atendendo a que a casa do século XVIII já não existe, uma vez que a demolição do interior já foi concretizada, qual o fim que o Município de Braga atribuiu à pintura de teto com moldura oval, no âmbito do licenciamento desta obra, sabendo que se trata de uma raridade da arquitetura bracarense do século XVIII?
Depois do último e-mail à CMB, e de alerta público, tudo indica que a obra foi embargada! Será que, só agora, foram detetadas desconformidades? De que natureza?
Cerca de 60 dias úteis após o primeiro e-mail enviado aos responsáveis pelo Património e Urbanismo, quando já só resta a fachada! Como foi possível?
Estranhamos que o pelouro do Urbanismo tenha anunciado o Prémio Reabilita Braga, para distinguir obras de reabilitação e regeneração urbana do património edificado da cidade e, em simultâneo, tenha uma atitude pautada pela inércia perante a demolição de edificado com elevado valor histórico-patrimonial.
Importa ter presente que o Património Cultural Construído é um Bem que as gerações anteriores nos legaram, um repositório vivo de saberes e ofícios, uma memória do passado, evidenciada em documentos da época, essencial à compreensão da cidade. Permitir a demolição destes bens culturais leva à perda de elementos identitários da nossa história comum.
É isso que queremos, como cidadãos, para o Património que Braga herdou de gerações passadas?
Vamos aceitar que o Município continue a permitir a demolição de edificado com valor arquitetónico, empobrecendo o Centro Histórico de Braga?