A Insula das Carvalheiras principiou a
ser escavada em 1983, em terreno adquirido pela CMB para instalação da Escola Primária
da Sé. O arquitecto responsável pelo projecto solicitou escavações prévias, que
foram dirigidas por Francisco Sande Lemos e Manuela Delgado (UAUM). Os
trabalhos prolongaram-se em 1984 e 1985.
Foi assim descoberto o cruzamento de duas ruas (de um cardus com um decumanus), um achado relevante, inédito em Braga, verificando-se
que no sentido nordeste se conservavam as estruturas de uma insula, ou domus.
A hipótese de se
construir a Escola no interior do quarteirão foi abandonada e desde logo se
pensou em integrar as ruínas descobertas na série de núcleos visitáveis de Bracara Augusta.
Entretanto, a UAUM e o Serviço Regional de Arqueologia
da Zona Norte avançaram com a proposta de classificação do núcleo como Imóvel
de Interesse Público, processo que seguiu os trâmites habituais. Deste modo, a Insula das Carvalheiras foi
integrada na lista de imóveis classificados publicada em 1990, o que garantiu a
protecção jurídica do sítio.
Mas o IPPC e os organismos que lhe sucederam nunca
deram seguimento ao que seria necessário para reforçar a salvaguarda do local:
o estabelecimento de uma Zona Especial de Protecção (ZEP). Porque que motivo a
DRCN nunca avançou com uma delimitação específica da área classificada em 1990,
estabelecendo uma ZEP?
Mais tarde, aquando de uma visita a Braga do Doutor
Hauschild (arquitecto e arqueólogo e, então, Director do Instituto Arqueológico
Alemão de Lisboa) este sublinhou que o local era uma oportunidade única para se
determinar o módulo urbanístico da cidade romana, pois havia área disponível, o
que nem sempre acontece nas antigas grandes urbes sobrepostas por aglomerados
posteriores.
Manuela Martins, que a partir de 1987 integrou a Direcção
do Projecto de Bracara Augusta,
assumiu esse objectivo realizando sucessivas escavações, até 1995. Estes trabalhos permitiram concluir,
sem margens para dúvidas, que o módulo urbano de Bracara estava de
acordo com os modelos clássicos da Antiguidade. Na sequência das escavações realizaram-se
diversos estudos, designadamente teses de mestrado, incidindo tanto sobre os materiais
recolhidos como sobre a arquitectura do edificado, que foi reconstituída. A par
disso foi desenvolvida uma reconstituição virtual, assaz minuciosa, pela UAUM.
Ou seja, estabeleceu-se um conhecimento bastante
pormenorizado acerca de uma unidade habitacional e da sua evolução desde o Alto
Império até ao seu progressivo abandono na Antiguidade Tardia. Aliás, o estudo
científico da Insula ou Domus das
Carvalheiras tem prosseguido de modo continuado. Paralelamente, escavações
noutros locais de Braga, como no logradouro da Casa Grande de Santo António das
Travessas, confirmaram as dimensões do módulo, reconhecendo-se em definitivo que
Bracara Augusta tinha sido planeada
como uma cidade ortogonal, segundo os modelos clássicos, desde a sua fundação.
Entretanto, a importância da conservação do monumento foi
discutida em várias ocasiões com a CMB, mas inutilmente. Preocupados com o
estado do conjunto, os arqueólogos da UAUM estiveram quase a aceitar a proposta
da CMB no sentido de se cobrirem as estruturas criando-se um espaço verde.
Contudo Ricardo Mar, arquitecto e arqueólogo espanhol, professor da
Universidade de Tarragona, que visitou o local, considerou que o núcleo era
relevante e se justificava ser valorizado pois era o único exemplo em Braga de
uma Domus estruturalmente intacta, podendo ser visitada como tal e
proporcionando uma leitura pedagógica da organização da cidade romana. A partir de então a UAUM recusou a proposta da
CMB e insistiu num projecto de valorização.
No entanto, nenhum
dos projectos apresentados se concretizou.
Finalmente a nova
vereação, presidida por Ricardo Rio, decidiu que era indispensável avançar com
a valorização. Assim está pendente, por iniciativa da CMB, uma candidatura
nesse sentido no âmbito do novo quadro de fundos europeus.
Por outro lado, a
Câmara decidiu em boa hora elaborar um Plano de Salvaguarda para todo o
quarteirão em cujo miolo se situa a Insula
das Carvalheiras. O documento está acessível no website da autarquia, de onde é
possível efectuar o download.
O processo ainda
está na fase inicial. Dos documentos já divulgados pensamos que os Termos de
Referência são elucidativos. Os motivos que justificam o Plano encontram-se bem
definidos e justificados.
Entendemos porém que, a leste, os limites do Plano
poderiam ser alargados sem suscitar obstáculos de maior. Deveria abranger os
espaços do adro da Igreja de S. Sebastião, Escola Básica da Sé e Largo do
Carvalheiras. E porquê? Porque são áreas de grande sensibilidade arqueológica,
em particular o Largo das Carvalheiras, em cujo subsolo se admite estar
conservada uma das ruas que saía do Forum
no sentido norte, assim como outras insulae. Trata-se aliás de um
terreno que se conserva intacto pelo menos desde as mais antigas imagens de
Braga. Por outro lado, é o átrio de entrada não só para a Insula das
Carvalheiras como também para a Escola da Sé, que está no mesmo alinhamento, ou
seja, cuja fachada Sul dava para a mesma rua (neste caso um decumanus).
Na preparação deste PPS, apresentado ao público no passado
dia 31 de Março, colaboraram com a CMB: a Direção Regional de Cultura do Norte,
a Unidade de Arqueologia da Universidade do Minho e a Faculdade de Arquitectura
da Universidade do Porto – Curso de Estudos Avançados em Património Arquitectónico.
Recorde-se a propósito que em Jan 2015 foi apresentada no Museu D. Diogo de
Sousa uma interessante exposição sobre "Intervenção arquitectónica em
contexto arqueológico: propostas e desafios para a cidade de Braga",
coordenada pelo Prof. Pedro Alarcão da FAUP, de que foi publicado o catálogo,
que contemplava as Carvalheiras.
Todavia ainda estamos na 1ª fase e “prevê-se um prazo
de cerca de 660 dias, acrescido do tempo necessário para consulta a entidades,
marcação de reuniões de concertação, desenvolvimento de estudos de apoio ao
adequado desenvolvimento do plano, de elaboração cartográfica e determinação
cadastral, etc.”. Ou seja, novembro de 2017 é o prazo limite para a conclusão do
Plano.
Mas como se articula todo este processo com
a valorização da Insula das Carvalheiras e abertura ao público? Será possível,
até à conclusão do Plano, disponibilizar o espaço para visita e usufruto da
população? Ou terá de se aguardar até final de 2017?