INTERVENÇÃO CÍVICA EM DEFESA DO PATRIMÓNIO

A ASPA criou este blogue em 2012, quando comemorou 35 anos de intervenção cívica.
Em janeiro de 2023 comemorou 46 anos de intervenção.
Numa cidade em que as intervenções livres dos cidadãos foram, durante anos, ignoradas, hostilizadas ou mesmo reprimidas, a ASPA, contra ventos e marés, sempre demonstrou, no terreno, que é verdadeiramente uma instituição de utilidade pública.
Numa época em que poucos perseguem utopias, não queremos descrer da presente e desistir do futuro, porque acreditamos que a cidade ideal, "sem muros nem ameias", ainda é possível.

segunda-feira, 20 de novembro de 2023

ENTRE ASPAS "Via pública: quem aceita o desafio?"

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O enorme défice na manutenção da via pública vai exigir um esforço inédito para a reequilibrar. 
Será a oportunidade para responder aos desafios do Século XXI, nomeadamente no que diz respeito à Mobilidade Sustentável, às Acessibilidades Inclusivas, às Alterações Climáticas, à Neutralidade Carbónica e à Emergência Ambiental. 

Em 2023, não há dúvida que o município de Braga carece de investimento na sua infraestrutura - viária, rede de drenagem das águas pluviais, etc. - pois, fruto da degradação e falta de manutenção, está a entrar em colapso.

Muitas das vias bracarenses carecem já de intervenção urgente, o que não é de admirar, considerando a média de 30 anos estipulada como durabilidade de uma rua e o facto de tantas terem muito mais idade. Visualmente é fácil identificar a extensão do problema:

Nos pavimentos betuminosos, a propagação da fissuração generalizada, chamada de "pele de crocodilo", mostra que a maioria das ruas requerem repavimentação integral;

* Nos pavimentos de paralelepípedos de granito, as deformações causadas por má execução e subsequentes intervenções, o desaparecimento do areão nas juntas e, finalmente, o levantamento de pedras são os principais sinais de necessidade de intervenção. Há largas dezenas, talvez centenas de ruas no concelho que precisam de refazer o pavimento;

* As diversas infraestruturas, de drenagem de águas residuais domésticas, pluviais, abastecimento de água, elétrica, telecomunicações, gás, etc., que apresentam patologias várias, desde o assoreamento das condutas, que requer limpeza, até à degradação das mesmas por motivos que requerem substituição ou equivalente. Os principais sinais de infraestrutura carecendo de intervenção são inundações, aluimentos, roturas e cortes de serviço recorrentes.


O quadro actual permite prever que os próximos executivos municipais verão a sua despesa fortemente condicionada pela necessidade de reparar a infraestrutura ou efetuar simples manutenção, onerosa pela dimensão do património. Existem, ainda, desafios e exigências que devem ser respondidos:

A lei das Acessibilidades, de 2006, impõe características aos passeios, escadas, rampas e demais componentes da via pública que permitam a sua utilização segura por pessoas de mobilidade condicionada - crianças, idosos, portadores de deficiência, pessoas em convalescença - ou seja, qualquer um e todos nós, a dada altura. A maioria dos passeios da cidade de Braga estão gravemente danificados, não cumprem os requisitos e, fora da cidade, há inúmeras vias que nem passeios têm;

*As novas normativas para o desenho da via pública, com vista a reduzir a sinistralidade rodoviária (exº: atropelamentos) que, atualmente, se repartem de forma igual pela cidade e freguesias limítrofes. Nas últimas décadas, o número de atropelamentos tem diminuído a par da diminuição de recurso ao modo pedonal e correspondente aumento da utilização do automóvel. No entanto, se não se tomarem medidas, é expectável que a sinistralidade torne a aumentar em função do pretendido crescimento dos modos suaves;

* O combate às alterações climáticas e a adaptação da cidade aos seus efeitos, via a redução da impermeabilização dos solos, reforçando a resiliência da via pública e infraestrutura às intempéries e temperaturas extremas, a criação de novas áreas arborizadas, zonas de sombreamento, adoção generalizada de coberturas ajardinadas, etc.;

* A criação de uma rede de rega urbana, com água com tratamento mais simples e económico, não potável, e que poderá ter fontes múltiplas e diversificadas como a captação fluvial, pluvial e até mesmo água resultante do tratamento das águas residuais domésticas, se necessário;

* A transição para a economia circular, via a escolha de materiais sustentáveis para revestimento da via pública, idealmente estandardizados, de proveniência sustentável, com materiais reciclados ou reutilizados e mais adequados a colaboração na adaptação às alterações climáticas, mais permeáveis e menos acumuladores de calor;

*O incentivo ao recurso à micromobilidade, modos suaves e transportes públicos, em detrimento do automóvel, de forma integrada e complementar;

* Outras situações que se julguem pertinentes, em resultado de discussão pública, audição prévia da população e suas necessidades e preocupações.


Portanto, fruto de anos de inação perante as exigências e de falta de estratégia política no que diz respeito à cidade que queremos para todos nós, existe a necessidade, mas também a oportunidade de fazer melhor, para benefício da população presente e futura: É necessário definir este desígnio como prioridade municipal e, também, como pacto político para o presente e o futuro.


O grande filósofo chinês Lao Tsé disse que a maior das viagens começa com um único passo. Formemos, portanto, um consenso político em torno deste desafio. Desenvolvamos uma mobilidade sustentável que não se esgote na cidade, mas alcance todo o concelho e os concelhos vizinhos. Abandonemos o paradigma do automóvel como base da mobilidade. Criemos uma rede de transportes públicos (TUB e não só) racional e eficiente, acessível e inclusiva, confortável e rápida, com primazia sobre o automóvel e em cooperação com os modos suaves. Respeitemos as pessoas com mobilidade condicionada, que somos todos nós a dado momento, em prol de uma cidade ativa e inclusiva. Tenhamos em conta a necessidade de adaptação às alterações climáticas. Adotemos materiais sustentáveis.


Este desígnio superior tem custos, queiramos ou não. A consignação de 10% do orçamento municipal anual responderia às necessidades da rede viária bracarense, que está presentemente avaliada em pouco mais de 350 milhões de euros. A aplicação da verba perseguindo criteriosamente os referidos objetivos produziria resultados assombrosos ao fim de uma década. Em 30 anos, o concelho estaria irreconhecível, com evidentes benefícios para a mobilidade sustentável, qualidade de vida da população, níveis de poluição, crescimento económico e desenvolvimento social.

Quem aceita este desafio?

                                                                       Pedro Pinheiro Augusto

                                                                                                                                 

PLANO E META

Atualmente, dadas as profundas alterações que imperiosamente têm de acontecer nas cidades, seja em matéria de mobilidade, de suprimento de carências de habitação, de qualificação urbanística ou ambiental, seja pelas múltiplas oportunidades de financiamento, é crucial a definição de estratégias, planos e metas de concretização faseada. Caso contrário, jamais qualquer obra que se faça será perspetivada para o futuro e não se alcançará a almejada sustentabilidade.

quarta-feira, 8 de novembro de 2023

ENTRE ASPAS: "Percevejo asiático - o novo “inquilino” indesejado"

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Desde meados de Setembro, moradores de vários pontos da cidade têm vindo a deparar-se com a presença de “intrusos” nas suas varandas, janelas e até dentro de casa. Trata-se do percevejo Halyomorpha halys, de nome comum percevejo marmoreado castanho ou percevejo asiático.

O percevejo marmoreado castanho é originário do Oeste Asiático, mas tem vindo a expandir-se a outros continentes. Foi detectado nos anos 90, nos EUA, estando hoje presente em todos os Estados do país, no Canadá, e no Chile. Na Europa, as primeiras intercepções de Halyomorpha halys datam de 2004, na Suíça e Liechtenstein. Passados poucos anos, espalhou-se por Itália (2007), Alemanha e Grécia (2011), França (2012) e Espanha (2016). Actualmente encontra-se praticamente em toda a Europa, tendo sido detectado pela primeira vez em Portugal no início de 2019, por um kiwicultor de Pombal.

Este insecto pertence à ordem Hemiptera, um grupo que inclui percevejos, afídeos e cigarras, e tem cerca de 2000 espécies em Portugal. Os percevejos Halyomorpha halys adultos são castanhos marmoreados, medem entre 12 a 17 milímetros de comprimento, têm duas bandas claras nas antenas e veios escuros nas extremidades das asas. Por estas características, são muitas vezes confundidos com a espécie Rhaphigaster nebulosa, um percevejo europeu e comum em Portugal, sugador de seiva de plantas como os choupos ou aveleiras.

O Halyomorpha halys é fitófago, ou seja, alimenta-se de plantas, picando e sugando os nutrientes de frutos, folhas, rebentos e até dos caules. Este percevejo não constitui ameaça a humanos ou animais (não morde, não pica, nem transmite doenças). Não deve ser confundido com o percevejo de cama (Cimex lectularius), insecto achatado muito pequeno (5 a 7 milímetros) que se alimenta de sangue humano, e que foi noticiado por causar problemas de saúde pública em Paris recentemente.

A grande ameaça que o Halyomorpha halys constitui prende-se com o facto de ser altamente polífago, ou seja, é capaz de se alimentar de inúmeras plantas, incluindo várias culturas economicamente relevantes no país: maçã, pêra, cereja, pêssego, ameixa, uva, laranja, tomate, feijão, milho, kiwi, pimento, frutos vermelhos, citrinos, entre outras. As perdas de produção agrícola podem ser bastante graves, uma vez que, ao alimentar-se, o percevejo pode provocar cicatrizes, depressões, deformações, descolorações nos produtos agrícolas, inviabilizando a sua comercialização. Só em 2010, o Halyomorpha halys causou prejuízos de mais de 37 milhões de dólares em pomares de macieiras no Oeste dos EUA. Na Europa, um dos países onde a sua presença tem causado mais preocupação é Itália, onde é considerado uma das maiores pragas de pomares frutícolas, causando avultados prejuízos nas produções.

O percevejo asiático é capaz de se reproduzir muito rapidamente em climas favoráveis como o de Portugal. Consegue também dispersar-se facilmente através do vôo (podendo voar 5km ou mais, por dia), mas também “à boleia”, em contentores, veículos e até malas de viagem. Assim, após poucos anos sem se fazer notar em Portugal, esta espécie foi-se reproduzindo e estabelecendo populações no país. Este ano, e particularmente agora com a chegada de temperaturas mais baixas, estão a ser identificadas inúmeras ocorrências da presença de Halyomorpha halys em ambiente doméstico não apenas em Braga, mas em todo o país. Este facto tem a ver com o comportamento de procura de abrigo por parte do percevejo para passar os meses mais frios. Após a sua fase activa e de reprodução durante os meses quentes, o percevejo asiático procura, a partir de Setembro, um lugar onde possa permanecer em diapausa (um estado de “hibernação” que permite sobreviver ao inverno sem alimento). Nessa altura, os adultos agregam-se (por vezes em grandes quantidades) em zonas sombrias e em estruturas, como barracões, armazéns, frechas de janelas, portas, veículos, podendo atravessar fissuras de apenas 7 milímetros. A sua presença não apresenta qualquer risco para os humanos ou animais. No início da primavera, quando as temperaturas aumentam, saem da diapausa, abandonam os abrigos e retomam a alimentação e reprodução.

Por ser uma espécie invasora, os cidadãos podem e devem matar os percevejos asiáticos com que se deparem, depois de confirmar que se trata de Halyomorpha halys. O esmagamento liberta um odor nauseabundo e alguns repelentes de insectos podem não ser muito eficazes. O ideal será manter as janelas fechadas ou colocar redes nas mesmas, para evitar a entrada dos percevejos na sua habitação. Poderá ainda colocar uma bacia com água e detergente na varanda ou parapeito, onde os insectos vão beber água e para onde poderá também varrê-los, acabando por ficar presos e morrer por afogamento, sem libertar maus odores.

Catarina Afonso (bióloga), com colaboração do FLOWer LAB, CEF, Universidade de Coimbra

Identificar e registar:

Em 2018, kiwicultores da zona Oeste e cientistas do FLOWer Lab do Centro de Ecologia Funcional da Universidade de Coimbra (CEF-UC) criaram conteúdos informativos sobre o Halyomorpha halys, que estão disponíveis no grupo “Percevejo asiático (Halyomorpha halys) PT” no Facebook. Com o aumento do número de ocorrências detectadas este ano, recomendam que os cidadãos submetam o registo fotográfico dos insectos (com dados do local e data) na plataforma inaturalist.org, para permitir o acompanhamento desta nova espécie invasora em Portugal.

terça-feira, 24 de outubro de 2023

ENTRE ASPAS "Património Cultural e Inclusão Social"

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Os últimos dias têm sido mediaticamente dominados, para além da guerra travada na Palestina e em Israel, pelos debates sobre pobreza em Portugal, os rendimentos dos portugueses e a consequência das políticas na coesão social versus a exclusão. A apresentação do Orçamento de Estado para 2024, a publicação do Plano de Ação da Estratégia Nacional de Combate à Pobreza 2022-2025 e as várias iniciativas associadas ao Dia Internacional pela Erradicação da Pobreza, que se celebrou no passado dia 17, constituem os principais factos desencadeadores desse debate. Dele tem estado ausente a relação do património cultural com as políticas de inclusão social.

Compreende-se este apagamento, em função da visibilidade de questões tão urgentes como a necessidade do aumento dos rendimentos de uma parte muito significativa dos portugueses, a questão crucial do acesso à habitação, como primeiro direito, as medidas que possam minorar os efeitos da inflação, eventualmente em risco crescente de agravamento em função do conflito armado na região que concentra a produção do petróleo. Porém, a defesa e preservação do património cultural não pode deixar de considerar a questão do direito ao seu usufruto pelas pessoas em situação de maior vulnerabilidade económica e social. O património cultural, como bem comum, exprime e, em muitos casos, materializa uma identidade cultural. Daí que o património cultural, material e imaterial, tenha um caráter universal e não possa deixar ninguém de fora.

A promoção da inclusão social pela cultura desdobra-se em dois aspetos nucleares. Em primeiro lugar, no acesso universal à cultura. Em segundo lugar na promoção da cidadania cultural.

O acesso universal à cultura desenvolve-se através de políticas públicas em duas vertentes fundamentais: a educação e a discriminação positiva de públicos desfavorecidos. A educação é consensualmente considerada como o primeiro e principal instrumento de correção de perpetuação das desigualdades sociais. Em especial, a educação desde idade muito jovem, com qualidade pedagógica, favorece a socialização das crianças, promove um sentido de pertença coletiva e é indispensável ao desenvolvimento integral, nos vários domínios, da linguagem ao pensamento crítico, do conhecimento do mundo às capacidades expressivas, da destreza física e psicomotora ao sentido estético. É pela educação que as crianças – todas as crianças – podem interpretar e compreender como André Soares conferiu a Braga a peculiaridade das suas formas barrocas e maneiristas, é pela educação que as crianças reconhecem na defesa do património arbóreo uma das condições essenciais da resistência às alterações climáticas, é pela educação que as crianças desenvolvem o seu sentido de pertença a uma comunidade e adquirem o respeito e a curiosidade pela cultura de outras comunidades. A educação de qualidade para todos é a condição de constituição de um “habitus” coletivo indispensável à existência de uma sociedade verdadeiramente cosmopolita e fraterna.

Mas à educação há que somar a adoção de medidas de discriminação positiva, ao nível nacional e local, para acesso à cultura das pessoas em situação de precaridade social.  Medidas como passes gratuitos para acesso a museus e monumentos, organização de visitas guiadas, tertúlias, ações de sensibilização patrimonial, incentivos à fruição cultural através de atividades descentralizadas, são essenciais para que todos possam participar e usufruir dos bens culturais.

Uma outra dimensão, da maior importância e que ultrapassa o nível do (indispensável) acesso a cultura é a promoção da cidadania cultural.  Esta pode definir-se como a liberdade de produção de formas culturais e o reconhecimento da genuinidade dessas formas. O sentido da cidadania cultural é hoje visível em muitos locais onde se promove ativamente a produção cultural das populações mais desfavorecidas e se contribui para a sua qualificação, através de iniciativas de ação cultural comunitária. Dos coros musicais às artes performativas, da recuperação de narrativas e contadores tradicionais à cooperação popular em residências artísticas, múltiplos são os domínios da ação cultural enraizada nas comunidades. Guimarães e Paredes de Coura, por exemplo, são municípios próximos de nós onde se desenvolvem ações de muita qualidade de arte comunitária.

 A cidadania cultural também se exprime no património cultural. Aliás, muito do nosso património imaterial é genuinamente popular e tem as suas raízes em grupos sociais afastados dos centros do poder ou dos detentores da riqueza. É o caso dos lenços de namorados, bordados por mulheres rurais; é o caso do figurado de Barcelos, construído por gerações de oleiros que erigiram as suas formas toscas a uma expressão plástica capaz de rivalizar com as cerâmicas de Picasso ou de Manuel Cargaleiro; é o caso do património musical em boa hora recolhido por Lopes Graça e Michel Giacometti. Mesmo no património edificado, quem poderá negar o contributo decisivo das pessoas mais humildes, do pedreiro edificador de catedrais ao entalhador que concebeu as formas de tantos retábulos e altares, do artesão dos tapetes e bordados que decoram os palácios aos pintores anónimos dos murais das casas de “brasileiros de torna viagem”?

 Favorecer a inclusão social através da cultura, pela educação e a discriminação positiva no acesso aos bens culturais e patrimoniais e criar as condições para a promoção e o reconhecimento da cidadania cultural constituem aspetos normalmente invisibilizados, mas que podem ser determinantes na construção de uma sociedade mais justa e mais coesa. 

Imagens:

terça-feira, 17 de outubro de 2023

ARVOREDO URBANO: Avaliação fitossanitária e risco de fraturas de árvores

A ASPA tem vindo a manifestar preocupação pelo excessivo abate de árvores na cidade, o que tem motivado a sua atuação junto do município. 
Recentemente fomos contactados, por várias pessoas, sobre o abate de árvores em curso, desde há cerca de um mês, na Av. Imaculada da Conceição, em Braga.


Contactámos o responsável, que nos informou ter sido realizado um estudo/diagnóstico, cujo relatório - "Avaliação fitossanitária e risco de fratura de árvores" - o município de Braga divulgou na respetiva página oficial.

Para além do risco de queda de árvores, é importante que a cidade se prepare para um futuro em que estão previstas ondas de calor e pluviosidade extrema (consultar a EMAC - Estratégia Municipal de Adaptação as Alterações Climáticas), pelo que importa ter em atenção que o arvoredo urbano, os corredores verdes municipais e a área florestal são de grande importância para o sequestro de carbono (CO2), indispensável à redução da emissão de gases com efeito de estufa (GEE), pois o CO2
 resultante das atividades humanas é o principal responsável pelo aquecimento do planeta Terra. 

 

Importa relembrar que, em 2020, a concentração de CO2 na atmosfera tinha aumentado para 48% acima do seu nível pré-industrial (anterior a 1750) e que, no âmbito da estratégia nacional, o município de Braga estabeleceu o objetivo de reduzir as emissões de CO2 em pelo menos 55% até 2030 e atingir a neutralidade carbónica em 2050.


Para saber mais:


segunda-feira, 9 de outubro de 2023

ENTRE ASPAS: Projeto "ESCOLA PATRIMÓNIO". O Santuário do Bom Jesus do Monte como espaço de aprendizagem.


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Quando as aulas ocorrem fora da escola, em contexto local, e as aprendizagens são agregadas em torno de temáticas comuns, focalizadas em tarefas colaborativas, práticas e simples, é habitual as crianças estarem atentas e envolvidas nas atividades, serem curiosas, criativas e críticas. Observam fenómenos naturais, conhecem e aprendem a valorizar os monumentos, ouvem lendas e estórias, constatam a presença da matemática no edificado e em seres vivos, partilham descobertas, convivem, etc.


O projeto "ESCOLA PATRIMÓNIO", desenvolvido pela Fundação Bracara Augusta, desenhado e dinamizado, em conjunto, pela Confraria do Bom Jesus do Monte, pelo Colégio D. Pedro V 1 e pela ASPA, tem em vista promover aprendizagens diversificadas, previstas no currículo do ensino básico, tendo como palco a Paisagem Cultural do Santuário do Bom Jesus do Monte. No passado dia 22 de setembro foi assinado um protocolo que incluiu, não só estas organizações, mas também os TUB, uma vez que esta empresa municipal disponibilizará o transporte necessário.

 

No Bom Jesus do Monte, classificado pela UNESCO (Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura) como Património Mundial da Humanidade, que proporciona recursos tão variados, com certeza, será fácil que a generalidade das crianças envolvidas no projeto ESCOLA PATRIMÓNIO adquiram conhecimentos (saber), capacidades (saber fazer) e atitudes (saber estar/participar), as três vertentes das aprendizagens essenciais, previstas no currículo do ensino básico.

O facto de cada sessão do projeto estar centrada num tema específico, que une diferentes componentes do currículo, e ser centrada em abordagens práticas, permite dar significado às aprendizagens e torná-las duradouras. Espera-se, assim, que as dinâmicas contribuam para o desenvolvimento pessoal e social de cada criança, proporcionando memórias agradáveis conservadas ao longo da sua vida e que esses saberes conduzam a novas vindas ao Santuário do Bom Jesus do Monte e a novas descobertas relativamente a este monumento que tem, também, o estatuto de Monumento Nacional.

Espera-se que, em breve, esta oportunidade seja aproveitada pelas escolas de Braga que lecionam o 1⁰ e 2⁰ ciclos, de modo a que as crianças envolvidas enriqueçam a sua literacia ambiental e cultural, e desenvolvam condições para que, no presente e no futuro, sejam cidadãos responsáveis em relação ao ambiente e ao património. Para que sejam defensores da herança cultural que receberam e que é visível na comunidade onde residem.

A Paisagem Cultural presente no Santuário do Bom Jesus do Monte passará, assim, a constituir um espaço de aprendizagens diversificadas e promotoras de uma CIDADANIA ATIVA. Tal como refere a UNESCO (2019), importa "repensar que o conhecimento e a aprendizagem podem moldar o futuro da humanidade e do planeta - repensar a educação, moldar o futuro".

Assim, no âmbito do projeto ESCOLA PATRIMÓNIO, o SANTUÁRIO DO BOM JESUS DO MONTE integra uma nova valência, a de espaço educativo de excelência, palco de aprendizagens académicas e sociais para crianças dos 1º e 2º ciclos.

Numa primeira fase os alunos alvo são do “1º ciclo”, sendo esta fase piloto da responsabilidade do Colégio D. Pedro V.

É uma honra, para a ASPA, poder ter parte ativa na organização dos guiões de trabalho para o 2⁰ ciclo e, também, de colaborar em iniciativas de suporte ao projeto.

 

A ASPA louva a iniciativa da Fundação Bracara Augusta, pelo facto de ter lançado o projeto ESCOLA PATRIMÓNIO que, nesta fase, se vai centrar no BOM JESUS DO MONTE. Também louva a colaboração da Confraria do Bom Jesus do Monte, como entidade parceira, bem como o apoio prestado pela AOF2, que se assumiu como mecenas nesta fase do projeto.

 

Formulamos votos para que este projeto contribua para que uma percentagem elevada de crianças que reside em Braga - nacionais e estrangeiras - tenha a oportunidade de fazer aprendizagens diversificadas, em contexto de Paisagem Cultural, que sejam motor de responsabilização ambiental e patrimonial das respetivas famílias e amigos e que, esse diálogo intercultural contribua para que vivam melhor na diversidade.

 

Não temos dúvidas que é pela EDUCAÇÃO que se prepara um FUTURO sustentável, razão pela qual é indispensável promover a literacia nas diversas áreas do saber, de modo a responsabilizar o cidadão relativamente a opções individuais e coletivas, nas suas diferentes vertentes. Se, a curto e médio prazo, queremos melhores cidadãos e melhores políticos, capazes de promover e defender uma agenda política sustentável, pautada pelos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS), temos de contribuir, desde já, para uma Educação de Qualidade.

                                                                                                   Teresa Barbosa

 

1 O Colégio D. Pedro V integra a rede de escolas associadas da UNESCO.

2 Empresa especializada na reabilitação, conservação e restauro do património construído.

 

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“A educação é a principal prioridade da UNESCO, porque é um direito humano básico e o pilar para a paz e o desenvolvimento sustentável”.


A Comissão Internacional sobre os Futuros da Educação foi estabelecida pela UNESCO em 2019, com o objetivo de reimaginar como o conhecimento e a aprendizagem podem moldar o futuro da humanidade e do planeta. A iniciativa incorpora o amplo envolvimento público e de especialistas e visa a catalisar um debate mundial sobre como a educação deve ser repensada em um mundo de crescente complexidade, incerteza e fragilidade.”


Consultar: https://unesdoc.unesco.org/ark:/48223/pf0000381115

segunda-feira, 25 de setembro de 2023

ENTRE ASPAS: "Dar espaço às pessoas e terra às cidades. Com visão e debate de ideias"

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Entre 16 e 22 de setembro comemorou-se mais uma Semana Europeia da Mobilidade e a 22 de setembro o Dia Europeu sem Carros. Os dias, semanas e anos temáticos têm um valor simbólico, procurando dar destaque e visibilidade a questões prementes de um determinado tempo. Espera-se, também, que sejam impulsionadores de mudanças sociais. 


A Semana Europeia da Mobilidade é uma iniciativa anual da União Europeia, desde 2002, que continua a ser totalmente justificada.

Há uma clara consciência de que é preciso reduzir o tráfego automóvel mas, apesar de alguns progressos, está-se longe dos objetivos. As estimativas apontam para cerca de 400 000 mortes anuais no continente europeu atribuíveis a poluição atmosférica, na sua grande maioria associadas à mobilidade. Portugal (juntamente com países tão distintos como a Alemanha ou a Grécia) foi condenado em junho deste ano pelo Tribunal de Justiça da União Europeia por não cumprir as regras europeias sobre qualidade do ar ao longo de dez anos. A par de Lisboa e Porto, Braga está sistematicamente acima dos níveis aceitáveis para vários indicadores da qualidade do ar, como partículas (PM2,5, PM10), dióxido de azoto (NO2), dióxido de enxofre (SO2) e ozono (O3).

Pensar a mobilidade nas cidades é particularmente importante porque é aí que mais impactos ela tem na vida das pessoas: poluição sonora e atmosférica, congestionamento e asfalto moldam a vida quotidiana em muitas partes de Braga, com custos ao nível da saúde física e mental, de tempo e de dinheiro, direta ou indiretamente. Se se calculasse e internalizasse os custos da mobilidade automóvel para o ambiente e para a saúde, cada automobilista teria muito a pagar a cada peão ou ciclista.

É, portanto, preciso tirar carros das cidades e dar espaço às pessoas. Em Braga, como noutras cidades, os automóveis definiram (e definem) o desenho das ruas em vez de se ajustarem a elas e aos múltiplos outros usos – sociais, culturais, ecológicos, etc. - que podem ter. Em Pontevedra, por exemplo, foi possível redesenhar o espaço urbano com foco nas pessoas com ganhos em todas as frentes aqui referidas e ainda ao nível da segurança rodoviária, do comércio local e da qualidade de vida em geral.

Restringir o acesso de alguns veículos às cidades, reduzir significativamente a velocidade máxima autorizada nas ruas das cidades, criar tarifas para acesso em automóvel a determinadas áreas são algumas medidas possíveis. Mas a mudança não se pode fazer só de proibições; tem que se basear em incentivos. A disponibilidade, a qualidade e o preço de transportes públicos é um aspeto essencial. Nesta Semana Europeia da Mobilidade, a Câmara Municipal de Braga anunciou que as deslocações de ida e volta nos TUB custariam 1 euro. Trata-se do tipo de incentivo que deveria ser tornado permanente e há muito mais a fazer ao nível da gestão da oferta de transportes públicos na cidade e arredores. O desenho das vias de circulação e as infra-estruturas são outros aspetos fundamentais e é positivo que se esteja – finalmente - a criar mais espaços dedicados à mobilidade em bicicleta. Essas intervenções têm, porém, sido objeto de várias críticas que poderiam ter sido evitadas com processos de decisão mais abertos, participados e democráticos do que os que têm sido adoptados. Há cada vez mais cidadãos atentos e intervenientes relativamente a estas questões e surgem, crescentemente, interseções de agendas, valores e princípios. Os movimentos que agregam os direitos das crianças à mobilidade e ao desenho das cidades, como, a iniciativa Kidical Mass, organizada pela BragaCiclável a 23 de Setembro, são disso exemplo. Cidades como Copenhaga, Helsínquia, Amesterdão e Viena conseguiram que mais do que 40% das deslocações sejam realizadas a pé ou de bicicleta. Muitas cidades portuguesas podem ter mais desníveis de relevo, mas é totalmente possível melhorar as condições para a prática de mobilidades alternativas.

Para além de destronar os carros das ruas das cidades, precisamos de preservar o espaço não betonizado e de reverter espaço alcatroado. Para reduzir os efeitos das ilhas de calor urbanas, para aumentar a permeabilidade dos solos e para potenciar o aumento de vegetação em espaço urbano, precisamos de mais terra nas cidades. O contacto das pessoas com a terra (e com espaços naturais ou naturalizados, em geral) tem inúmeros impactos benéficos amplamente documentados. Paris decidiu levantar 40% do seu asfalto nos próximos anos para alcançar estes objetivos.  Nas obras que estão em curso em Braga para potenciar mudanças na circulação, está-se, em muitos casos, a betonizar e a asfaltar demais (ver imagens). As faixas para bicicletas não têm que implicar muita construção e os passeios podem ser largos sem serem cimentados ou alcatroados, ou sequer pavimentados de outro modo na sua totalidade. Substituir calçada portuguesa por cimento, como se tem feito nalgumas ruas de Braga, não é, seguramente, o caminho certo.

 

É possível imaginar e é perfeitamente possível concretizar cidades mais humanas, mais saudáveis, e mais felizes. Vivemos um tempo de grande mudança, a muitos níveis. Este é o momento para os poderes públicos equacionarem o que querem criar para e com os seus cidadãos e ponderarem cuidadosamente as escolhas que fazem. A transparência e o debate de ideias são sempre preferíveis a outros modos de exercício político.


Anabela Carvalho, Departamento de Ciências da Comunicação, Universidade do Minho

 

terça-feira, 12 de setembro de 2023

ENTRE ASPAS: "EDIFÍCIO DOS CONGREGADOS. Reconhecer valor, respeitar e conservar"


Fomos alertados, no início do mês, para o facto de ter sido pendurado um quadro elétrico, e fios, no Janelão Central do Edifício dos Congregados cuja fachada foi construida sob desenho do arquitecto André Soares (1720-1769) e consta no Mapa das  Ruas de Braga de 1750.

Para o arquitecto Domingos Tavares, “a Basílica e Casa dos Congregados” é, em especial, a obra que melhor permite compreender a evolução do pensamento arquitectónico de André Soares (Tavares 2022:4). Eduardo Pires de Oliveira - para quem André Soares foi o maior vulto da arte entre o tardo barroco e o rococó português - afirmou que o edificado da casa e igreja dos Congregados deixou marca diversificada da sua obra (Oliveira, 2019: vol.1, 61,62).

Janelão Central do Edifício dos Congregados, impossível de fotografar sem a “cascata” de fios e caixa, como se observa na imagem, é destacado pela Direção Geral do Património Cultural do seguinte modo: “O próprio remate do edifício denota a mesma tendência ondulada que emana dos restantes vãos e, principalmente, do janelão central, cuja forma se assemelha a uma fechadura (Smith, 1973, p. 31).

Uma visita ao local permite concluir que o referido quadro elétrico está  ligado ao armário de distribuição de rede elétrica, colocado no passeio há mais de 20 anos. Terá sido, pois, a fonte de alimentação para o espetáculo que decorreu na Avenida Central, no âmbito da Noite Branca, no fim de semana. Trata-se, portanto, de um improviso de mau gosto.

Transitório ou não, verifica-se um desrespeito gritante em relação ao Convento, Colégio e Igreja dos Congregados, classificado como Imóvel de Interesse Público, cujo Janelão Central é um dos elementos mais notáveis.



Quem autorizou a instalação da “engenhoca” na fachada de um edifício classificado, com distinção de âmbito nacional, situado em pleno centro da cidade?








Enviámos um “e-mail” ao Senhor Presidente da Câmara, com alertas e sugestões, admitindo que não tenha sido do conhecimento do responsável da CMB o uso de um valioso elemento arquitectónico como suporte de fios eléctricos e que a intervenção não tenha contado com monitorização, por parte de técnicos do município, de modo a garantir o respeito que este monumento exige.

 

Relembrámos que o Edifício dos Congregados, actualmente sob tutela da Universidade do Minho, tem uma história ligada à cultura e ao ensino, desde o tempo dos Oratorianos, notabilizando-se no século XVIII pela cultura filosófica. O Oratório destacou-se como pioneiro dos novos caminhos ascéticos e culturais. Posteriormente albergou a Biblioteca Pública e, mais tarde, a Escola do Magistério Primário.

O Edifício dos Congregados, para além desta situação, não tem usufruído da necessária conservação e, hoje, tanto o exterior como o interior, revelam sinais preocupantes que não se coadunam, de modo algum, com o seu valor patrimonial. 

A fachada e o edifício dos Congregados merecem o máximo respeito e, como tal, sugerimos que o Município de Braga estabeleça: 

1- Um contacto urgente com a EDP (E-Redes), no sentido de ser retirado o armário de distribuição da rede elétrica colocado por baixo de uma das janelas emblemáticas de André Soares do Edifício dos Congregados, que a DGPC destaca (ver fotografia em anexo).

2- A averiguação, no sentido de identificar a responsabilidade da colocação de caixa e fios, mesmo que provisórios.

3- Um diálogo entre a Câmara Municipal de Braga, Universidade do Minho e Basílica dos Congregados, no sentido de se encontrarem meios de financiamento, em conjunto, para o restauro do edifício (interior), claustros e fachada, bem como conservação dos telhados

4- Que os serviços da câmara possam zelar pelo jardim dos claustros e a fonte com chafariz, espaço que é visitado por turistas e, no estado em que se encontra, transmite uma imagem pouco abonatória do modo como as entidades públicas, em Braga, lidam com edifícios emblemáticos do Barroco Bracarense.

Sugerimos, ainda, ao Sr. Presidente da Câmara de Braga, que seja celebrado um protocolo com a Universidade do Minho, no sentido de as salas de concertos e conferências do Edifício (Salão Nobre, sala Santa Cecília e auditório, por exemplo) serem usadas nos eventos promovidos pela Câmara, no âmbito da cultura musical, de modo a criar condições para que estas salas tenham uso e dignifiquem a Universidade do Minho e Braga, a "Capital do Barroco" em Portugal. A existência de piano de cauda facilitaria, com certeza, a qualidade dos eventos.

Vai realizar-se em Braga no final do corrente mês, o evento designado "Braga Barroca". O “website” do município de Braga refere que a "primordial" razão para a organização deste evento é " reforçar a sensibilização da população para a salvaguarda do nosso património". Braga Barroca é, sem dúvida, uma iniciativa a louvar. Mas importa que o Barroco seja valorizado e respeitado todos os dias do ano, o que não está a acontecer, infelizmente. Por outro lado, sugerimos ao município que acrescente, ao conjunto de iniciativas anunciadas no âmbito de Braga Barroca, uma sessão multidisciplinar que faça o balanço do estado dos monumentos da Idade Moderna (sécs. XVII e XVIII) situados na cidade de Braga, elaborando um conjunto de recomendações para a CMB e para a tutela do Património Histórico.

Basta um único exemplo para justificar esta proposta da ASPA: do outro lado da Avenida Central, quase em frente aos Congregados, fica o edifício das Convertidas, que tem sido maltratado e que merece um projecto de valorização urgente.

Obviamente, o poder local deve procurar o apoio financeiro de fundos europeus, para projectos elaborados em consonância com o Governo e em diálogo com a sociedade civil.

Não há muito tempo reuniu-se em Braga, no Mosteiro de Tibães, na esplêndida Sala do Capítulo, o Conselho de Ministros do Governo de Portugal. Com muito aparato mediático. Com modéstia, lembramos ter sido a ASPA a entidade que mais lutou pela salvaguarda do Mosteiro, conseguindo que fosse adquirido pelo Estado (como é do conhecimento público e da tutela do património). Teria sido uma atitude louvável, o sr. Ministro da Cultura, no âmbito da deslocação a Braga, agendar uma reunião com a ASPA, para debater as questões do Património Histórico bracarense, tanto mais que a associação pediu a intervenção do Ministério da Cultura com vista à defesa do património bracarense.

A ASPA, mesmo que não agrade aos poderes, continuará a lutar pela defesa dos numerosos testemunhos da História de uma cidade milenar.

segunda-feira, 28 de agosto de 2023

ENTRE ASPAS: "Cidade ambientalmente sustentável. Uma prioridade política"


As agendas políticas têm de deixar de ter as temáticas associadas ao Território e ao Ambiente apenas como retórica e flor de lapela dos seus agentes. 

O planeamento urbano, a nível municipal e intermunicipal, pressupõe decisões integradas no que diz respeito ao uso do solo, aos rios, às áreas inundáveis, à vegetação ripícola (ribeirinha) que envolve as linhas de água e às zonas húmidas, aos parques verdes e corredores verdes, entre outros meios fundamentais para o desenvolvimento dos ecossistemas, a promoção da biodiversidade e o equilíbrio ecológico.

O Ambiente e o Território são, por isso, matéria que, cada vez com maior relevância, ocupa o leque de preocupações do cidadão melhor informado, mais responsável e exigente do bem-estar e da qualidade de vida, pensando sempre, também, no futuro. 

Importa ter presente que oito dos ODS - Objetivos do Desenvolvimento Sustentável -, definidos pela Assembleia Geral das Nações unidas até 2030, dizem respeito ao ambiente. Um diz respeito ao que se espera das cidades em termos de tomada de decisão e nível de compromisso com os objetivos comummente estabelecidos. Assim, decisores políticos e população em geral estão colocados perante desafios que, em conjunto, deveremos perseguir. Não é tão difícil assim, desde que haja vontade. A regeneração dos solos, das águas e do ar são focos a ter em constante presença. 

Conforme relembramos no entre aspas "Restaurar a Natureza na Europa: uma urgência", a aprovação, pelo Parlamento Europeu, da Lei de Restauro da Natureza, obriga os estados-membros a restaurar 20% do seu património natural terrestre e marinho, até 2030, e todos os habitats degradados até 2050. Em breve teremos a versão final da Lei e, então, Portugal deverá transferir para os normativos nacionais esse objetivo, e pôr em prática, no território nacional, decisões integradas relativamente ao uso do solo e à edificação, à área florestada, às linhas de água e sua envolvente, ao litoral e ao oceano, entre outros. 


A exemplo da tendência nacional, ainda que forçada por via legal, não deveria Braga procurar travar a expansão urbana arbitrária e tratar de se reestruturar e rever a forma de crescer, qualificando-se? Continuará a ter sentido ampliar a cidade no sentido do meio rural e da área florestada, destruindo solo agrícola e reduzindo solo permeável e áreas que são suporte à diversidade da vida animal e vegetal? Não deverá optar-se por planear, para essasa zonas, a urbanização que promova a menor ocupação de solo, com soluções arrojadas de construção em altura, edifícios que integrem área verde (jardins ou bosques verticais), libertando solo para criação de parques e corredores verdes, ligando a cidade aos rios e à área natural? A urbanização a realizar no âmbito do Plano de Urbanização das Sete Fontes poderia ser assumida como laboratório de experimentação.

Convém ter presente que uma cidade que promove a biodiversidade e seus habitats é, também, uma cidade que proporciona qualidade de vida a quem nela habita e que é capaz de contribuir para a adaptação às alterações climáticas, contrariando, através do planeamento urbano, o aumento de ondas de calor e de pluviosidade extrema, conforme previsto para as próximas décadas. 

Podíamos seguir exemplos de outras cidades, algumas na Europa e outras noutros continentes, por vezes com temperatura muito mais elevada e que, desde cedo, compreenderam que a nova construção, nas cidades, deve seguir um paradigma oposto ao das últimas décadas. Soluções construtivas em altura, com jardins e bosques verticais, articulados com corredores verdes que cruzam a cidade e facilitam o percurso, a pé ou de bicicleta, pelos seus habitantes e por quem nos visita. Área verde que promove a biodiversidade. 


Em 2012, Milão, em Itália, que muitos conhecem pela cidade antiga e seus monumentos, como a Piazza del Duomo, com a Catedral (Duomo) e as Galerias Vittorio Emanuele, optou pela reabilitação de uma zona degradada que transformou numa zona de elevada qualidade - residencial, de comércio, serviços e espaços de espetáculo -, com construção em altura que inclui bosques verticais (reflorestamento urbano), parques verdes, corredores verdes e zonas com água. Um projeto de arquitetura urbana que contribui para a regeneração do meio ambiente, na medida em que os bosques verticais aumentam a humidade do ar, absorvem CO2, favorecem o isolamento acústico,  a diminuição da temperatura nos meses mais quentes e uma maior luminosidade nos meses de inverno, bem como a atração de aves e insetos polinizadores, promovendo a biodiversidade. 


Singapura, na Ásia, foi mais arrojada ainda quando, em 2012, investiu na criação de zonas verdes – parques, reserva natural, estufas, corredores verdes, jardins botânicos e, ainda, as “árvores” tecnológicas que captam água da chuva e atraem insetos e aves -, articuladas com edifícios altos e com bosques verticais, no âmbito de um planeamento urbano exigente sob o ponto de vista arquitetónico e ambiental. É a cidade com maior densidade de árvores em zona urbana.


Em Paris, na outrora zona degradada de Clichy-Batignolles, foi construído um bairro habitacional ecossustentável, de grande qualidade arquitetónica, lado a lado com o novo parque Martin Luther King, sendo 60 por cento das habitações a custo controlado, comprovando a possibilidade de unir três aspetos indispensáveis nas cidades do presente: habitação social, proteção do ambiente e qualidade arquitetónica e urbanística. 


Também em 2012, Braga desenvolveu o projeto A Regenerar Braga, no âmbito do qual substituiu lajes antigas de granito por placas de granito industrial, transformando praças e ruas históricas em zonas impermeáveis e excessivamente quentes. Perdeu uma oportunidade para construir cidade, como era esperado, de acordo com as preocupações já existentes em matéria ambiental. 


O que nos reserva o futuro?

Braga vai manter formas de atuar do passado ou vai olhar em frente e começar a construir a cidade do futuro, sustentável, de qualidade e inclusiva?


Está em causa a casa comum (a que se refere o Papa Francisco na encíclica Laudato si`) e TODOS a temos de defender.