Caminhar melhora a nossa saúde: fortalece músculos, esqueleto e vasos sanguíneos; reduz a pressão arterial, o risco de ataque cardíaco, de acidentes vasculares cerebrais, de alguns tipos de diabetes e de cancro; combate a ansiedade e a depressão. Caminhar põe-nos em contacto com o que entendemos designar por “natureza”: quando caminhamos na cidade, ouvimos o cantar das aves, sentimos a frescura da aragem ou o vento suão, observamos as lagartixas que se escondem entre as pedras e os melros que se protegem nas sebes. Caminhar até ao trabalho é hoje um luxo apenas possível para alguns, uma vez que é necessário tempo para o fazer e tempo é um dos bens mais escassos em sociedades com o padrão socio-económico que hoje impera. Mas, caminhar antes de chegar ao local de trabalho, permite ao mecânico pensar na origem do ruído do motor do carro que está a reparar, ao professor elaborar/criar a melhor estratégia para uma aula, ao investigador a oportunidade de entender o último resultado da pesquisa que tem em mãos, ao médico relembrar o resultado de exames necessários ao diagnóstico de um caso complicado que acompanha. Caminhar, pode assim ser tempo de criação, mas também pode ser aquele tempo em que esquecemos as tarefas diárias, os compromissos sociais e nos encontramos connosco mesmos, sendo, pois, um tempo de reflexão. Caminhar põe-nos em contacto connosco e com os outros, permitindo a emergência de um sentido de pertença que fortalece os laços de comunidade e a predisposição para a cidadania democrática.
Infelizmente, na maior parte das nossas cidades não é fácil caminhar e Braga não é excepção; tendo mesmo a afirmar que é particularmente difícil e esta é uma questão que deve colocar-se no contexto mais alargado da estratégia de mobilidade do município. Se caminhar é a mais antiga forma de mobilidade do ser humano, em Braga é a menos privilegiada, ou antes, não é sequer verdadeiramente contemplada: uma caminhada entre Nogueira, onde vivo, e o centro da cidade leva cerca de 30 minutos em que é necessário transpor “passeios” partidos ou em mau estado — e isto quando existem — e desníveis impossíveis de transpor a idosos, a crianças e a pessoas com mobilidade reduzida; onde não existem travessias (passadeiras) nos locais por onde a caminhada naturalmente nos conduz; em que a vegetação — invariavelmente bem-vinda — e, por vezes, o estacionamento de veículos, obriga a partilhar a estrada movimentada com os automóveis. O sacrossanto automóvel que, em Braga, tomou conta, há muitos anos, da maneira como nos deslocamos na cidade e que a condiciona em aspetos que vão muito para além da questão do tráfego. Se, juntamente com os transportes públicos e a bicicleta, caminhar fosse uma prioridade na estratégia de mobilidade do município, as emissões de gases com efeito de estufa diminuiriam e a qualidade do ar melhoraria, reduzindo, assim, a poluição e contrariando os efeitos da mudança climática; o ruído permanente que a circulação automóvel produz e que tem consequências negativas na saúde decresceria e o inferno que é, atualmente, o trânsito na cidade e que prejudica principalmente quem precisa de se deslocar para o trabalho, começaria a resolver-se. E a calamidade que é o número de mortos e feridos por atropelamento tenderia para zero, que é a única situação compatível com uma vida verdadeira.
Tornar Braga um município amigo daqueles que caminham, por vontade ou por necessidade, exige muito mais do que medidas avulsas, pois, o que, importa mesmo, é reduzir o número de automóveis que circulam nas ruas e estradas. A maior parte dos cidadãos não entende as deslocações a pé como uma questão política, mas esta é, na essência, uma questão política, no sentido mais amplo da palavra: a vida na polis. Tornar um município caminhável requer uma abordagem que vai para além da resolução estrita dos problemas da mobilidade e que desafia igualmente as prioridades para o município, em sede de Plano Diretor Municipal (PDM), tanto em termos habitacionais, como ambientais e, obviamente, de ocupação do solo. E necessita que sejam criadas as condições necessárias para que os cidadãos se envolvam nas decisões que dizem respeito à sua vida diária, quer seja no caso da mobilidade e acessibilidade, no interior do concelho, como em articulação com concelhos vizinhos, como em qualquer outro assunto de interesse público.
Uma cidade que pode ser percorrida a pé é uma cidade que se observa, se conhece e se compreende, onde é mais fácil encontrarmo-nos e conviver, onde o espaço público é realmente usufruído por todos, onde as diferenças sociais se esbatem e é mais fácil a Democracia.
Sou uma caminhante, vivo em Braga e desejo que, cedo porque se faz tarde, a minha cidade seja mais segura, mais inclusiva, mais amigável, menos poluída e melhor preparada para fazer face aos desafios ecológicos e sociais que se nos colocam.
Teresa Salomé
Caminhar reforça a Cidadania ativa
Quem tem por hábito caminhar, seja para se deslocar para o local de trabalho ou por lazer, está mais atento à freguesia e à cidade onde reside. Observa, sinaliza espaços cuidados ou abandonados, identifica boas práticas e locais de difícil transposição ou, mesmo, inseguros. Sente as dificuldades, suas e de outros(as).