INTERVENÇÃO CÍVICA EM DEFESA DO PATRIMÓNIO

A ASPA criou este blogue em 2012, quando comemorou 35 anos de intervenção cívica.
Em janeiro de 2024 comemorou 47 anos de intervenção.
Numa cidade em que as intervenções livres dos cidadãos foram, durante anos, ignoradas, hostilizadas ou mesmo reprimidas, a ASPA, contra ventos e marés, sempre demonstrou, no terreno, que é verdadeiramente uma instituição de utilidade pública.
Numa época em que poucos perseguem utopias, não queremos descrer da presente e desistir do futuro, porque acreditamos que a cidade ideal, "sem muros nem ameias", ainda é possível.

quinta-feira, 19 de junho de 2025

ADAPT.LOCAL.25

Realizou-se ontem, em Braga, o 𝟗𝐒𝐞𝐦𝐢𝐧𝐚́𝐫𝐢𝐨 𝐝𝐞 𝐀𝐝𝐚𝐩𝐭𝐚𝐜̧𝐚̃𝐨 𝐋𝐨𝐜𝐚𝐥 à𝐬 𝐀𝐥𝐭𝐞𝐫𝐚𝐜̧𝐨̃𝐞𝐬 𝐂𝐥𝐢𝐦á́𝐭𝐢𝐜𝐚𝐬 - ADAPT.LOCAL.25 -, iniciativa da Rede de Municípios para a Adaptação Local às Alterações Climáticas. O vereador do Ambiente da Câmara de Braga elencou um conjunto de iniciativas realizadas neste âmbito.

Destacamos o contributo do presidente da “adapt.local” – presidente da Câmara de Loulé -, que referiu a importância de os municípios alterarem a orgânica interna, de modo a centrar as opções municipais na ação climática e na economia circular e considerou indispensável o envolvimento, neste objetivo comum, dos técnicos municipais, escolas e comunidade. Em Loulé, lançou desafios às escolas em matéria climática/justiça climática, para que todos assumam estas temáticas como causas suas e, tidos, contribuam para a melhoria que é urgente concretizar. 

Lamentou que a imprensa nacional não dê visibilidade a estas problemáticas, que assumiu como causas da humanidade.   


No que diz respeito ao painel "Adaptação Climática Local: 10 anos depois do ClimAdapt e o futuro", foram apresentados contributos relevantes para a causa climática/ justiça climática, nomeadamente:

  • Esta rede veio despertar consciências por parte de técnicos de municípios, bem como agregou conhecimento científico e técnico
  • É essencial a possibilidade de acesso a fundos comunitários que permitam, claramente, melhorar condições de adaptação às alterações climáticas
  • É essencial que os municípios se articulem com a comunidade académica, no sentido de implementarem práticas, em vários contextos, que permitam uma melhor adaptação às alterações climáticas
  • Os municípios devem criar condições para que a população possa usufruir dos recursos ambientais locais
  • Os Planos Diretores Municipais (PDM) não foram adaptados à mudança dos tempos, nomeadamente às exigências das alterações climáticas
  • No geral, os municípios lidam bem com os riscos do passado, mas têm uma má performance relativamente aos riscos do futuro
  • É frequente ver um péssimo urbanismo, com falta de corredores verdes, espaço urbano impreparado para as pessoas; falta de sensibilidade ambiental; atribuição de licenças de construção que, hoje, não têm qualquer sentido; ausência de decisões, ao nível do ordenamento, no que diz respeito a recursos hídricos, agricultura e floresta e resiliência do solo, numa perspetiva, efetiva, de adaptação às alterações climáticas; etc.
  • É urgente melhorar a capacitação de técnicos municipais e de organismos do estado que lidam com problemáticas ambientais; é preciso ligar peças do puzzle “ambiente”, dispersas por vários pelouros
  • As opções para o território devem respeitar o Ambiente, o que pressupõe respeitar a respetiva EMAAC (Estratégia Municipal de Adaptação às Alterações Climáticas)
  • É essencial que os municípios criem momentos ao longo do ano em que participem representantes de todas as Divisões, em que a adaptação às alterações climáticas e justiça climática sejam o cerne da reflexão
  • É urgente avaliar o que foi realizado em cada município, no âmbito da adaptação às alterações climáticas, de que modo teve impacto positivo nas várias vertentes da ação municipal e se contribuiu para a melhoria da qualidade de vida da população para perceber se é necessário mudar de trajetória.
  • Apesar de estarmos numa situação de emergência climática, verifica-se falta de capacidade e competências para atuar ao nível das políticas públicas
  • Muitas câmaras que têm como referencial uma EMAAC, não a aplicam nos documentos estratégicos como o PDM
  • Os problemas das Cidades/Concelhos não se resolvem com os PDM
  • Os diferentes intervenientes nos processos – a nível municipal e com instituição de âmbito nacional - precisam trabalhar em conjunto, respeitando o Ambiente e atuando de modo a garantir a necessária Adaptação às Alterações Climáticas
  • É urgente melhorar os sistemas de monitorização de práticas que se cruzam com problemáticas ambientais.

Este foi um Seminário que permitiu a reflexão sobre outras temáticas que exigem tomadas de decisão que garantam a adaptação às alterações climáticas, nomeadamente: “Do restauro ecológico à resiliência climática dos sistemas hidrológicos” e “Justiça Climática”. Também duas visitas técnicas.

terça-feira, 17 de junho de 2025

ENTRE ASPAS: "Arquitetura para a vizinhança"


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É justo dizer que a programação da Braga 25 tem olhando a cidade de forma ampla, procurando incluir bairros e periferias urbanas, e mesmo quando essa inclusão é mais retórica que efetiva não deixa de ser um avanço face às políticas culturais a que o município nos habituou.






O Festival de Arquitetura e Arte – Forma de Vizinhança insere-se nesse espírito de abrangência, propondo diferentes intervenções arquitetónicas que visam valorizar o espaço público em urbanizações que nos últimos cinquenta anos cresceram e modificaram a cidade. Tem curadoria e direção artística da Space Transcribers, sendo um dos promotores a empresa municipal FazCultura.

Coerente no conceito e generoso na extensão, o Festival conta com oito intervenções, que vão das Parretas à zona da Makro, das Fontainhas à Quinta da Capela, passando ainda pelo Fujacal, pelas Hortas Urbanas de S. Vicente, da Quinta da Armada e da Quinta da Lameira. Projetadas para decorrer entre junho e novembro do corrente ano, as intervenções foram pensadas num modelo dinâmico, com possibilidade de mudar de forma durante o processo, pelo que é prematuro ajuizar desde já o seu impacto. Tal como marcamos presença na cerimónia de abertura deste Festival, a ASPA não deixará de acompanhar o seu desenvolvimento.

Vale a pena sublinhar que um Festival com estas características se ajusta à ideia de uma cidade dinâmica, em movimento e transformação, contrariando aquela espécie de “provincianismo braguista” que demasiadas vezes enclausura a cidade no seu Centro Histórico, deleitando-se na contemplação nostálgica de uma imaginação de cidade que pouco tem a ver com a cidade real em que nos cabe viver. Ainda assim, dando como boa a ideia e o ponto de partida do projeto, há aspetos que merecem discussão e crítica.

Um primeiro aspeto tem a ver com o uso e abuso da retórica de participação. Sucedeu na cerimónia de apresentação do Festival, tanto pela voz dos curadores como no discurso de Olga Pereira, vereadora e representante do município. Proclamações contentes acerca do envolvimento e participação cidadã no projeto ou da auspiciosa devolução do espaço público às comunidades, soam bem a alguns e enganarão outros tantos, mas são manifestamente exageradas. Uma intervenção arquitetónica numa praça não devolve espaço à comunidade, apenas transforma o que já existia e era usado - nos melhores casos valorizando-o, nos piores casos enchendo-o de tralha e erguendo barreiras que não faziam ali falta nenhuma. Quanto à participação cidadã, reconheça-se a dificuldade: se em bairros onde existem associações ativas, sejam elas de moradores ou outras, a interlocução é possível, em bairros com elevada rotação de moradores e com baixos índices de participação em assuntos comuns, as dificuldades aumentam. Posso, neste ponto, servir como testemunha: enquanto habitante de um bairro contemplado por uma das obras arquitetónicas, em nenhum momento fui informado do projeto que ali estava em curso nem jamais fui convocado para discutir fosse o que fosse. Percebida a dificuldade, assinale-se o abuso retórico, mais grave por provir de um governo municipal que pouco fez nesta matéria, por exemplo dispensando-se de promover a criação de associações de moradores ou optando por um modelo de orçamento participativo que reduz o debate ao espaço virtual evitando os encontros e confrontos reais que fomentam a cidadania.

Ainda que decorra do primeiro, o segundo aspeto que gostaria de sublinhar é de natureza mais genérica, remetendo para a caracterização dos públicos da cultura que um evento como o Braga 25 pretende alcançar. Também aqui importa distinguir a retórica do que de facto acontece. Se o discurso produzido para o Festival de Arquitetura e Arte sublinha a abrangência, não é preciso um olhar especialmente atento para se perceber uma significativa homogeneidade no público que se dispôs a acompanhar a visita aos espaços intervencionados. Maioritariamente jovem e de look alternativo, poderia ser caracterizado por um alinhamento desalinhado, esdrúxulo conceito que pretende sinalizar um desalinhamento face à cidade tomada pelo capitalismo financeiro e um alinhamento com processos de gentrificação urbana, imaginando que dela há-de sair uma cidade mais verde, mais sustentável, mais humana. Claro que não há nenhum problema com este alinhamento, mas ele é revelador de como uma certa forma de promover cultura segmenta mais do que une. Importa que a Braga 25 seja uma oportunidade de criar um ecossistema cultural mais rico e diversificado, contrariando uma certa monocultura, na qual a proclamada abrangência e participação raramente sai do papel ou do discurso.

Reconheço a dificuldade em chegar a certos públicos, mas é justamente em razão dessa dificuldade que se deveria fazer caminho aproveitando o impulso da Braga 25. Claro está que a dificuldade em fazer chegar a alguns públicos mensagens mais complexas ou estruturadas não se esgota na cultura, sendo real também no ecossistema político. Se é verdade que este Festival dá um passo no sentido certo ao pensar uma cidade descentrada, é certo também que não se desviou um milímetro do urbano que constitui a malha consolidada da cidade, deixando intocadas as áreas problemáticas, aquelas onde a cidade se move por ação de agentes que não encaixam nem no perfil hipster de quem tem protagonismo no Festival, nem no perfil distanciado e neutro da média burguesia que habita os bairros intervencionados.

                                        Luis Cunha, Instituto de Ciências Sociais, U.M.

terça-feira, 3 de junho de 2025

PROJETO ESCOLA PATRIMÓNIO


O
Projeto ESCOLA PATRIMÓNIO, promovido pela Fundação Bracara Augusta, desenvolvido e coordenador pela ASPA, no âmbito de um protocolo que também envolve a Confraria do Bom Jesus do Monte levou, ao Santuário do Bom Jesus do Monte, quatro turmas da EB1 de S.Mamede e duas turmas da EB1 de S. João do Souto.
A articulação com as escolas foi da responsabilidade do pelouro da Educação da Câmara Municipal de Braga.
Cerca de 140 crianças recordaram e aplicaram aprendizagens realizadas na escola, no âmbito das diferentes disciplinas do currículo, mas também fizeram descobertas diversificadas com recursos a materiais específicos das diferentes áreas disciplinares. Observaram exemplares da fauna e da flora existentes no Bom Jesus, perceberam que há ameaças à paisagem protegida, realizaram atividades matemáticas nos coretos, escadório e num pequeno bosque junto ao lago.
Conviveram, riram, brincaram e divertiram-se.

Vivências agradáveis que proporcionaram novas aprendizagens, num contexto muito especial: a Paisagem Cultural do Santuário do Bom Jesus do Monte, classificada pela UNESCO como Património Mundial da Humanidade.
Mais informação no facebook sobre:

segunda-feira, 2 de junho de 2025

ENTRE ASPAS "Recolhimento de Santa Maria Madalena e São Gonçalo (ou das Convertidas)"

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Mandado construir por iniciativa do Arcebispo de Braga, D. Rodrigo de Moura Teles, com o objetivo de albergar “mulheres pecadoras convertidas a Deus”, o Recolhimento de Santa Maria Madalena, vulgo Recolhimento das Convertidas, foi inaugurado no dia 25 de abril de 1722. Uma ironia com mais de trezentos anos, diria, que hoje mais parece um esgar. Uma ruína. E, todavia, a ironia ganha corpo se pensarmos num 25 de abril mais próximo, com cheiro a cravos e revolução, liberdade, igualdade e a conquista do direito ao voto pelas mulheres. Uma luta de séculos que importa não esquecer.

As paredes do Recolhimento falam de ausência de liberdade, de anátema social, de violência sobre o corpo das mulheres ou da sua rasura. De mulheres que, importa sublinhá-lo, não escolheram professar ordens ou a vida conventual, antes foram “recolhidas” e “convertidas” à força, de forma a manter o espaço público “limpo” do mal que elas representavam. Esta a nota de diferença de instituições como os Recolhimentos. Ao que tudo indica, o Recolhimento das Convertidas parece fazer parte dos chamados Asilos de Madalena (ou, na versão irlandesa, Lavandarias de Madalena), instituições criadas no século XVIII um pouco por toda a Europa e América do Norte, e que subsistiram até ao final do século XX. As Lavandarias de Madalena ganharam recentemente visibilidade com a publicação do livro Pequenas Coisas como Estas (2022), da irlandesa Claire Keegan, que dá a conhecer o drama de uma das vítimas destas instituições que se mantiveram ativas até ao final da década de oitenta do século XX. O livro viria a ser adaptado ao cinema por Enda Walsh e direção de Tim Mielants, em 2024.

 

Quando cheguei à cidade, em 1985, justamente no ano em que decorre a ação do filme, lembro-me de ver uma ou outra mulher à porta. Residentes ou visitantes, sobre elas nada sei. O que hoje lamento. Braga transbordava de edifícios conventuais e de espaços de clausura pelo que este era, para mim, apenas mais um. De resto, um edifício austero, discreto, sem outra nota digna de registo para além da pedra de armas do arcebispo, do emblema das convertidas e das janelas gradeadas do torreão.

 

Deu o sol muitas voltas à terra, e eu sem dar pelo edifício. Até que um dia o encontro com a obra de Maria Ondina Braga, nascida a dois passos do Recolhimento, me fez dar de caras com as paredes brancas de alvenaria e escutar as vozes para lá da alvura. O destino de solidão e de exílio destas mulheres assombraria para sempre a escritora que procurou dar corpo, voz, um nome, a este e a outros silêncios na sua escrita, às “histórias, sempre histórias do infortúnio das mulheres”, dos seus dramas ocultos, atravessados pela temática da miséria e da violência, do aborto clandestino e da desigualdade social. A história da “Mil-Homens” é apenas uma delas.

 

Recolhimento, oração e trabalho marcavam o compasso dos dias. A troco de um prato de comida, de um catre onde dormir e de reabilitação social, as mulheres viam-se confinadas ao mutismo e à clausura, impedidas de qualquer contacto com o exterior, como demonstra a grade de ferro que separa os fiéis na Capela de São Gonçalo (aberta ao culto geral) das “convertidas” que assistiam à missa: tão apertada a malha ou treliça de ferro que nem um dedo conseguiria passar e tocar o outro lado. Quando, pela primeira vez, transpus a porta do Recolhimento, estremeci, como se levasse um murro no estômago. Quem ainda hoje visitar o Recolhimento das Convertidas ficará impressionado, entre outras coisas, com a dupla porta do edifício e as sete chaves da porta interior, descobrindo que, mais do que uma expressão idiomática, “estar fechado a sete chaves” é antes o testemunho de um exílio forçado. Ou com o “Tronco”, cubículo em pedra, frio, húmido e sem luz, onde eram encerradas as mulheres que mereciam “castigo”. Ou com os instrumentos de penitência e de "conversão" - “haec sunt arma melitiae nostrae”- pintados no painel central do teto da Capela.

Entrar no espaço reservado da capela é descobrir que as grades são a rasura do olhar e a impossibilidade do tato e da comunicação, de uma qualquer grafia migrante. Elas são a trama do silêncio, as linhas de uma invisível escrita da solidão. Percorrer os espaços íntimos, corredores, celas e jardins é viajar numa máquina do tempo, recuar a esse elegante século XVIII e vislumbrar pelo buraco da fechadura o avesso da sumptuosidade aristocrática, da religiosidade barroca, despojadas de doces cupidos e anjos celestiais, quando não do próprio Cristo saudoso de um calor mais humano. Apesar das ruínas de hoje, tudo permanece intacto, suspenso, como se o tempo tivesse poupado este oásis de silêncio no deserto da cidade, ele próprio cúmplice destas mulheres condenadas à burka invisível do anátema social.

 

É este espaço que urge agora salvar e preservar como espaço de memória para as gerações futuras. A proposta de criação da Casa da Memória da Mulher no Recolhimento das Convertidas merece todo o apoio, desde logo por se tratar de um espaço único (tanto quanto julgo saber) no país, tendo em conta que não foi adulterado ao longo do tempo. Pela carga simbólica, histórica e cultural de que se reveste, a futura Casa da Memória da Mulher legitimamente merece figurar ao lado de espaços congéneres europeus, como é o caso do Køn – Gender Museum (The Women’s Museum), em Aarhus, Dinamarca, um dos raros museus do mundo sobre a temática de género e igualdade, fundado em 1982, e um dos pontos de atratividade turística da cidade.

 

Depois de anos de abandono, que esta proposta conjunta de várias entidades e personalidades ligadas à cultura, ao património, à intervenção cidadã e à comunidade académica tenha finalmente avançado e sido apresentada às entidades com capacidade de intervir na matéria é um sinal de esperança. A sua concretização seria não apenas uma forma de prestar homenagem às mulheres de todos os tempos, mas também uma das melhores notícias no ano em que Braga se orgulha de ser Capital Nacional de Cultura e o Recolhimento das Convertidas completa mais de trezentos anos de história e de memória.                       

Isabel Cristina Mateus

Universidade do Minho/CEHUM

terça-feira, 20 de maio de 2025

ENTRE ASPAS: "Casa da Memória da Mulher no Recolhimento das Convertidas"

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O Recolhimento das Convertidas tem sido objeto de inúmeras agressões, no geral devidas ao descuido e ao descaso, sem que haja atuação da parte das entidades responsáveis no sentido de salvar este Monumento de Interesse Público, um memorial do barroco conventual, único, que manteve a sua autenticidade até ao séc. XXI.


Restou à comunidade e a entidades como a ASPA manifestarem-se de forma persistente junto de quem pode atuar no sentido de evitar a condenação definitiva do monumento, sublinhando a perda irreparável que significaria o seu desaparecimento, não só para Braga, mas também para o país.

Foram inúmeros os alertas junto da anterior tutela do património (DRCN e DGPC) e do Ministério de Administração Interna (MAI), acompanhados de imagens elucidativas. Os responsáveis por esses organismos não têm dúvidas, com certeza, que o Recolhimento das Convertidas se encontra em risco e que a Capela poderá não resistir por muito mais tempo. Uma janela aberta e vidros partidos foram motivo de alerta recente junto do MAI e do Património Cultural I.P.

 

Foi perante este cenário e ameaça de perda, que várias entidades e personalidades ligadas à cultura, ao património, à intervenção cidadã e à comunidade académica, se uniram no propósito de pôr fim à degradação galopante do edifício do Recolhimento das Convertidas, sugerindo às entidades públicas com capacidade de intervir – CIM Cávado e Câmara Municipal de Braga, Património Cultural IP e CCDR-Norte – a sua recuperação e reafectação a novas funcionalidades, como CASA DA MEMÓRIA DA MULHER.

Neste sentido, assegurada a recuperação do edifício, são propostos três eixos fundamentais de estruturação do projeto:

  • Criação de um Espaço de Memória do Recolhimento das Convertidas.
  • Aproximação à comunidade académica, através da promoção de investigação, estudo e divulgação da condição feminina, em Braga, em Portugal, na Europa e no Mundo.
  • Abertura à comunidade: espaços e iniciativas. 

A criação da CASA DA MEMÓRIA DA MULHER pressupõe uma reabilitação que respeite a autenticidade deste memorial do barroco conventual e que salvaguarde o património edificado, associando-lhe o património imaterial decorrente da memória do que foi este espaço e das memórias de quem o habitou.  Esse contexto muito especial permitirá diferentes valências e uma panóplia alargada e regular de atividades que contribuirão, com certeza, para o enriquecimento da oferta cultural e educativa na cidade, apelando a um amplo envolvimento da comunidade.

Tendo a ASPA avançado com esta proposta, foi com enorme satisfação que viu associar-se à mesma a CIVITAS Braga, a UMAR (União de Mulheres Alternativa e Resposta), a APAV (Associação de Apoio à Vítima), o Tin.Bra (Academia de Teatro de Braga), a Associação Cultural SUONART e o Grupo de Cantares Tradicionais Mulheres do Minho, bem como elementos da comunidade. Estamos certos de que, a breve prazo, outras entidades e personalidades se juntarão na subscrição desta proposta que, neste momento, já reúne o apoio de de subscritores de diversas áreas - movimento associativo e cultural, comunidade académica, etc. –, bem como de diversas organizações e sensibilidades políticas.

As entidades e personalidades subscritoras entregaram à CIM - Cávado, ao Património Cultural I.P. e à CCDR-N Cultura e Património, bem como à Senhora Ministra da Cultura e ao ICOMOS, as razões e o sentido da proposta de criação, no Recolhimento das Convertidas, da CASA DA MEMÓRIA DA MULHER.

Espera-se que, a breve prazo:

  • A tutela do Património realize uma avaliação técnica da situação em que se encontra o Recolhimento das Convertidas e a Capela da São Gonçalo, para que sejam definidas soluções para a sua conservação e restauro, com respeito pela autenticidade deste memorial do barroco conventual, de modo a garantir a preservação do espírito do lugar.
  • Seja concluído o processo de permuta, entre a CIM Cávado e o Estado Português, de modo a que o Recolhimento das Convertidas passe, definitivamente, para a propriedade da CIM Cávado.
  • Que a CIM Cávado, com o contributo do Património Cultural IP, organize o projeto de reabilitação do edifício tendo em vista a criação da CASA DA MEMÓRIA DA MULHER.
  • Que o Património Cultural I.P. e a CCDR N encontrem fontes de financiamento, para que a conservação e restauro se concretize, permita salvar o monumento e dar-lhe um uso público como polo Cultural e Educativo ao serviço da comunidade.

Neste momento, em que o monumento está em risco, é essencial a união de esforços, por parte destas entidades públicas, para o salvar. Tal como foi necessária a união de organizações da sociedade civil para organizar esta proposta de transformação do Recolhimento das Convertidas em CASA DA MEMÓRIA DA MULHER, para o salvar e dinamizar, com uso público, de modo a permitir a sua entrega às gerações vindouras.                                                                                                                                                                                                ASPA

Passaram já três séculos desde que, em 25 de abril de 1722, foi inaugurado o Recolhimento das Convertidas e 13 anos desde a sua classificação como Monumento de Interesse Público (Portaria nº 665/2012). Um tempo longo que culmina na agonia lenta deste memorial do barroco conventual, um elemento patrimonial valioso pelo que representa e pela sua singularidade que, apesar de ter resistido à ruína plena, poderá sucumbir se nada for feito para o salvar.

Nascido num 25 de abril, dia em que se comemora a Liberdade, este edifício representa bem o mote escolhido este ano para a celebração do Dia Internacional dos Monumentos e Sítios, comemorado a 18 de abril: Património Resiliente Face a Catástrofes e Conflitos. Mote que foi o ponto de partida para este projeto.

Para salvar o Recolhimento das Convertidas e a Capela de São Gonçalo é imprescindível o empenho do novo Governo, bem como dos deputados eleitos por Braga, para a Assembleia da República. O interesse público assim o exige!  

segunda-feira, 5 de maio de 2025

ENTRE ASPAS: "Memórias e Percursos de Vida na Academia Sénior"

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Incentivar os cidadãos a escrever sobre momentos marcantes das suas vidas, como a infância, a juventude, o percurso profissional ou a família, pode culminar na criação de um livro coletivo de memórias. Foi o que aconteceu quando, no ano letivo de 2022/23, nos propusemos iniciar, ainda que com algum espírito experimental, a disciplina de Memórias e Autobiografias na recém-criada Academia Sénior pelo município de Braga.


Começando com uma partilha de experiências sobre as memórias mais significativas na vida de cada um, o projeto foi ganhando forma e deu mote a um empenho surpreendente na produção da escrita e na descoberta de imagens (fotografias e objetos) muito para além do inicialmente expectável. A infância, a escola primária, o primeiro ordenado, o namoro, o casamento, o nascimento dos filhos, o primeiro emprego, o antigo ultramar, o 25 de abril, as festas familiares e comunitárias, mas também a descoberta de capacidades criativas e de ficção que se revelavam adormecidas. Tudo convergiu para a produção do livro “Memórias e Autobiografias e os 50 anos do 25 de Abril” (2024) dividido em três capítulos: Memórias do Eu, Memórias do Nós (com relevo para o 25 de abril, nos 50 anos da sua comemoração) e Outras Memórias. São muitas as histórias vividas e recontadas e outras ainda recriadas a partir do exercício da recordação pessoal. Um projeto que busca preservar o Passado e simultaneamente criar Presente, num equilíbrio entre a preservação e a criação ativa. 

O projeto também deu lugar à integração de desenhos elaborados por crianças (netos, bisnetos ou outras) que escutaram as histórias a partir dos familiares ou pessoas próximas e as ilustraram com a sua própria sensibilidade, fazendo-as tomar parte num projeto de valorização do diálogo intergeracional e da fixação da memória como património. Reconhecer as experiências dos outros desenvolve competências não só de atenção, escuta e empatia - fundamentais para o crescimento pessoal e social das crianças - como estimula a compreensão de que o passado é uma fonte de sabedoria e identidade que deve ser preservada. Na verdade, a valorização destes registos permite que novas gerações conheçam melhor os seus antepassados e compreendam o contexto das suas próprias vidas.

Por outro lado, refletir sobre o seu percurso permite aos mais velhos dar significado às experiências vividas e reconhecer a riqueza da sua história pessoal. A escrita e a partilha destas memórias ajudam a combater a solidão e estimulam a autoestima e o sentido da identidade. A memória, a organização do pensamento e a agilidade mental são também estimulados. O fortalecimento dos laços comunitários e o registo de tradições, valores e acontecimentos históricos, locais ou nacionais que, de outro modo, poderiam perder-se, são fundamentais para a preservação da memória coletiva.

Os 50 anos do 25 de abril celebrados enquanto procedíamos à organização do livro não podiam naturalmente deixar de ser realçados e integrados nas atividades. Há datas que moldam vidas. O 25 de abril é uma delas. Dar voz a quem o viveu é um dever de memória e os seniores da nossa Academia são os seus guardiões. “O 25 de abril na minha vida” foi o mote para os testemunhos diretos que cada um, sem exceção, prestou para a coletânea de gravações em vídeo que foram produzidas em plena sala de aulas na base de um curto guião elaborado para o efeito. O resultado final foi mostrado em público no auditório da Biblioteca Lúcio Craveiro da Silva nas vésperas da comemoração e, a convite da sua diretora, também integrado no depósito da Aqualibri, biblioteca digital do Cávado. No capítulo Memórias do Nós, figuram alguns desses registos incluindo poemas inspirados e até musicados pelos próprios, destinados a esse momento marcante. À medida que as recordações do 25 de Abril emergiam, surgiam das gavetas memórias adormecidas – fotografias, objetos e histórias – agora prontas para serem partilhadas. É exemplo um dos textos onde figura um isqueiro e uma máquina de barbear pertencentes ao militar morto junto à PIDE no próprio dia 25 de Abril de 1974, e se lê: “a revolução não teve só o vermelho dos cravos a dar-lhe cor, teve o sangue de quatro pessoas que se manifestavam na rua António Maria Cardoso em Lisboa, em frente ao edifício da PIDE/DGS”. O soldado em causa, afeto a Penamacor, encontrava-se em Lisboa de licença militar, o que só foi possível por ter obtido dinheiro emprestado para a viagem em troca dos dois objetos que penhoraram o valor do empréstimo. O militar não mais voltaria para os reaver pois, por ironia do destino, no mesmo dia em que Portugal recuperava a liberdade, quis o drama que não vivesse para a usufruir. No contexto deste livro, estes objetos, silenciosos, mas cheios de significado, tornaram-se pontos de partida para a narrativa aqui contada, fazendo desencadear recordações, emoções e histórias mais ou menos esquecidas, mas que são essenciais para a configuração de uma História mais plural, sentida e completa. Note-se que são, muitas vezes, os relatos pessoais que preenchem os silêncios e as omissões da narrativa dominante, trazendo à luz as vozes que raramente aparecem nos livros oficiais – vozes do quotidiano, das margens, das emoções vividas, dos detalhes que escapam às grandes narrativas…

 

A Academia Sénior tem assim um papel único enquanto guardiã de memórias vivas. Ao registar estas experiências, está a dar um contributo precioso à história local e nacional. Está a contribuir para que nos conheçamos melhor a nós próprios.

sexta-feira, 25 de abril de 2025

CASA DA MEMÓRIA DA MULHER no RECOLHIMENTO DAS CONVERTIDAS


Recolhimento das Convertidas tem sido objeto de inúmeras agressões, a maior parte delas devidas ao descuido e ao descaso, sem que haja atuação por parte das entidades responsáveis no sentido de salvar este Monumento de Interesse Públicoum memorial do barroco conventual, único, que manteve a sua autenticidade até ao séc. XXI.



Restou à comunidade e a entidades como a ASPA (Associação para a Defesa, Estudo e Divulgação do Património Cultural e Natural) manifestarem-se de forma persistente e firme junto de quem pode efetivamente atuar no sentido de evitar a condenação definitiva do monumento, sublinhando a perda irreparável que significaria o seu desaparecimento, não só para Braga, mas também para o país. 


Na verdade, passaram já três séculos desde que, em 25 de abril de 1722, foi inaugurado o Recolhimento das Convertidas e 13 anos desde a sua classificação como Monumento de Interesse Público (Portaria nº 665/2012). Um tempo longo que culmina na agonia lenta deste memorial do barroco conventual, um elemento patrimonial valioso pelo que representa e pela sua singularidade, que apesar de ter resistido à ruína plena, em breve sucumbirá se nada for feito. A janela aberta e os vidros partidos evidenciam o abandono a que o monumento está sujeito.


Nascido num 25 de abril, dia que é hoje de comemoração da Liberdade, este edifício representa bem o mote escolhido este ano para a celebração do Dia Internacional dos Monumentos e Sítios, comemorado a 18 de abril: Património Resiliente Face a Catástrofes e Conflitos. 

Foi perante este cenário e esta ameaça de perda que várias entidades e personalidades ligadas à cultura, ao património e à intervenção cidadã (ASPA, CIVITAS Braga,  UMAR, APAV, Tin.Bra e SUONART), se uniram no propósito de pôr fim à degradação galopante do edifício do Recolhimento das Convertidas, em Braga, sugerindo às entidades públicas com capacidade de intervir – CIM Cávado e Câmara Municipal de Braga, Património Cultural IP e CCDR N – a sua recuperação e reafetação a novas funcionalidades, como CASA DA MEMÓRIA DA MULHER.

Garantindo que não se perde a memória do que foi este espaço do barroco conventual, salvaguardando o património edificado sem deixar de lhe associar o património imaterial decorrente da memória de quem habitou aquelas paredes. 



O Recolhimento das Convertidas manteve, desde 1722, a autenticidade dos espaços do quotidiano das mulheres que lá davam entrada e, a partir daí, deixavam de ter contacto com o exterior. Limitando-se às celas, à Capela, aos pátios e à Cerca conventual. Capela onde marcavam presença sem serem vistas. 

Neste sentido, assegurada a recuperação do edifício, propomos três eixos fundamentais de estruturação do projeto:

  • Criação de um Espaço de Memória do Recolhimento das Convertidas
  • Aproximação à comunidade académica, através da promoção de investigação, estudo e divulgação da condição feminina, em Braga, em Portugal, na Europa e no Mundo.
  • Abertura à comunidade: espaços e iniciativas. 

A criação da CASA DA MEMÓRIA DA MULHER pressupõe uma reabilitação que respeite a autenticidade deste memorial do barroco conventual e garanta a preservação do espírito do lugar.  Esse contexto muito especial permitirá diferentes valências e uma panóplia alargada e regular de atividades que contribuirão, com certeza, para o enriquecimento da oferta cultural e educativa na cidade, apelando a um amplo envolvimento da comunidade.

Tendo a ASPA avançado com esta proposta, foi com enorme satisfação que viu associar-se à mesma a CIVITAS Braga, a UMAR (União de Mulheres Alternativa e Resposta), a APAV (Associação de Apoio à Vítima), o Tin.Bra (Academia de Teatro de Braga), a Associação Cultural SUONART e o Grupo de Cantares Tradicionais Mulheres do Minho, bem como elementos representativos da comunidade. 

Estamos certos de que, a breve prazo, outras entidades e personalidades se juntarão na subscrição desta proposta que, neste momento, já reúne o apoio de elevado número de subscritores de diversas áreas - movimento associativo e cultural, comunidade académica, etc.–, bem como de diversas organizações e sensibilidades políticas.

Nesse sentido, as entidades e personalidades subscritores entregaram à CIM Cávado, ao Património Cultural I.P. e à CCDR N, um texto com imagens, onde apresentam as razões e o sentido da sua proposta de criação no Recolhimento das Convertidas da CASA DA MEMÓRIA DA MULHER.

Esperamos que, em breve:

  • seja realizada uma avaliação rigorosa da situação em que se encontra o Recolhimento das Convertidas e a Capela de São Gonçalo, por parte do Património Cultural I.P., de modo a que sejam definidas soluções para a sua conservação e restauro, com respeito pela autenticidade deste memorial do barroco conventual, garantindo a preservação do espírito do lugar;  
  • se conclua o acordo de permuta, entre a CIM Cávado e o Estado Português, em curso desde 2017, de modo a que o Recolhimento das Convertidas passe para a propriedade da CIM;
  • o Património Cultural I.P. e a CCDR N identifiquem e agilizem fontes de financiamento, de modo a garantir conservação e restauro que permita salvar o monumento e dar-lhe um uso público, como CASA DA MEMÓRIA DA MULHER, garantindo a sua entrega às gerações vindouras, como polo Cultural e Educativo ao serviço da comunidade
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A terceira imagem, de 2019, bem como as imagens do interior da Capel barroca, captadas em 2022 (segunda e sexta), permitem imaginar como estará, em 2025, a pintura de teto da capela e, também, os pisos e coberturas do monumento. 

A quarta imagem mostra uma janela aberta e a quinta imagem não deixa dúvidas que há vidros partidos na janela de guilhotina por cima da capela. Em abril de 2025.  Até quando?

Uma observação atenta do exterior do monumento permite perceber que está votado ao abandono: uma janela aberta, vidros partidos e uma das frentes de rua  que surpreende quem observa, atentamente, o Recolhimento das Convertidas.



A frente urbana da Avenida central, que supostamente estava protegida pela ZEP do Monumento (Portaria nº 665/2012, de 7 de novembro), foi alterada conforme se observa na imagem.




Contudo, a  Portaria especifica que "A zona especial de proteção tem em consideração a sua implantação numa área da cidade perfeitamente consolidada, onde outros edifícios com interesse arquitetónico contribuem para a valorização do imóvel e a sua fixação visa salvaguardar alguns dos imóveis da frente urbana da Avenida Central, bem como toda a Rua de São Gonçalo que, por ser bastante estreita, estabelece uma relação direta com o imóvel.”


INFORMAÇÃO DISPONÍVEL SOBRE O MONUMENTO:

RECOLHIMENTO DE SANTA MARIA MADALENA E SÃO GONÇALO/RECOLHIMENTO DAS CONVERTIDAS (informação detalhada: SIPA - Sistema de Informação para o Património Arquitectónico)


RECOLHIMENTO DE SANTA MARIA MADALENA E SÃO GONÇALO/RECOLHIMENTO DAS CONVERTIDAS (Processo: Património Cultural - Património Imóvel)


ENTRE ASPAS SOBRE O MONUMENTO: