INTERVENÇÃO CÍVICA EM DEFESA DO PATRIMÓNIO

A ASPA criou este blogue em 2012, quando comemorou 35 anos de intervenção cívica.
Em janeiro de 2023 comemorou 46 anos de intervenção.
Numa cidade em que as intervenções livres dos cidadãos foram, durante anos, ignoradas, hostilizadas ou mesmo reprimidas, a ASPA, contra ventos e marés, sempre demonstrou, no terreno, que é verdadeiramente uma instituição de utilidade pública.
Numa época em que poucos perseguem utopias, não queremos descrer da presente e desistir do futuro, porque acreditamos que a cidade ideal, "sem muros nem ameias", ainda é possível.

terça-feira, 12 de setembro de 2023

ENTRE ASPAS: "EDIFÍCIO DOS CONGREGADOS. Reconhecer valor, respeitar e conservar"


Fomos alertados, no início do mês, para o facto de ter sido pendurado um quadro elétrico, e fios, no Janelão Central do Edifício dos Congregados cuja fachada foi construida sob desenho do arquitecto André Soares (1720-1769) e consta no Mapa das  Ruas de Braga de 1750.

Para o arquitecto Domingos Tavares, “a Basílica e Casa dos Congregados” é, em especial, a obra que melhor permite compreender a evolução do pensamento arquitectónico de André Soares (Tavares 2022:4). Eduardo Pires de Oliveira - para quem André Soares foi o maior vulto da arte entre o tardo barroco e o rococó português - afirmou que o edificado da casa e igreja dos Congregados deixou marca diversificada da sua obra (Oliveira, 2019: vol.1, 61,62).

Janelão Central do Edifício dos Congregados, impossível de fotografar sem a “cascata” de fios e caixa, como se observa na imagem, é destacado pela Direção Geral do Património Cultural do seguinte modo: “O próprio remate do edifício denota a mesma tendência ondulada que emana dos restantes vãos e, principalmente, do janelão central, cuja forma se assemelha a uma fechadura (Smith, 1973, p. 31).

Uma visita ao local permite concluir que o referido quadro elétrico está  ligado ao armário de distribuição de rede elétrica, colocado no passeio há mais de 20 anos. Terá sido, pois, a fonte de alimentação para o espetáculo que decorreu na Avenida Central, no âmbito da Noite Branca, no fim de semana. Trata-se, portanto, de um improviso de mau gosto.

Transitório ou não, verifica-se um desrespeito gritante em relação ao Convento, Colégio e Igreja dos Congregados, classificado como Imóvel de Interesse Público, cujo Janelão Central é um dos elementos mais notáveis.



Quem autorizou a instalação da “engenhoca” na fachada de um edifício classificado, com distinção de âmbito nacional, situado em pleno centro da cidade?








Enviámos um “e-mail” ao Senhor Presidente da Câmara, com alertas e sugestões, admitindo que não tenha sido do conhecimento do responsável da CMB o uso de um valioso elemento arquitectónico como suporte de fios eléctricos e que a intervenção não tenha contado com monitorização, por parte de técnicos do município, de modo a garantir o respeito que este monumento exige.

 

Relembrámos que o Edifício dos Congregados, actualmente sob tutela da Universidade do Minho, tem uma história ligada à cultura e ao ensino, desde o tempo dos Oratorianos, notabilizando-se no século XVIII pela cultura filosófica. O Oratório destacou-se como pioneiro dos novos caminhos ascéticos e culturais. Posteriormente albergou a Biblioteca Pública e, mais tarde, a Escola do Magistério Primário.

O Edifício dos Congregados, para além desta situação, não tem usufruído da necessária conservação e, hoje, tanto o exterior como o interior, revelam sinais preocupantes que não se coadunam, de modo algum, com o seu valor patrimonial. 

A fachada e o edifício dos Congregados merecem o máximo respeito e, como tal, sugerimos que o Município de Braga estabeleça: 

1- Um contacto urgente com a EDP (E-Redes), no sentido de ser retirado o armário de distribuição da rede elétrica colocado por baixo de uma das janelas emblemáticas de André Soares do Edifício dos Congregados, que a DGPC destaca (ver fotografia em anexo).

2- A averiguação, no sentido de identificar a responsabilidade da colocação de caixa e fios, mesmo que provisórios.

3- Um diálogo entre a Câmara Municipal de Braga, Universidade do Minho e Basílica dos Congregados, no sentido de se encontrarem meios de financiamento, em conjunto, para o restauro do edifício (interior), claustros e fachada, bem como conservação dos telhados

4- Que os serviços da câmara possam zelar pelo jardim dos claustros e a fonte com chafariz, espaço que é visitado por turistas e, no estado em que se encontra, transmite uma imagem pouco abonatória do modo como as entidades públicas, em Braga, lidam com edifícios emblemáticos do Barroco Bracarense.

Sugerimos, ainda, ao Sr. Presidente da Câmara de Braga, que seja celebrado um protocolo com a Universidade do Minho, no sentido de as salas de concertos e conferências do Edifício (Salão Nobre, sala Santa Cecília e auditório, por exemplo) serem usadas nos eventos promovidos pela Câmara, no âmbito da cultura musical, de modo a criar condições para que estas salas tenham uso e dignifiquem a Universidade do Minho e Braga, a "Capital do Barroco" em Portugal. A existência de piano de cauda facilitaria, com certeza, a qualidade dos eventos.

Vai realizar-se em Braga no final do corrente mês, o evento designado "Braga Barroca". O “website” do município de Braga refere que a "primordial" razão para a organização deste evento é " reforçar a sensibilização da população para a salvaguarda do nosso património". Braga Barroca é, sem dúvida, uma iniciativa a louvar. Mas importa que o Barroco seja valorizado e respeitado todos os dias do ano, o que não está a acontecer, infelizmente. Por outro lado, sugerimos ao município que acrescente, ao conjunto de iniciativas anunciadas no âmbito de Braga Barroca, uma sessão multidisciplinar que faça o balanço do estado dos monumentos da Idade Moderna (sécs. XVII e XVIII) situados na cidade de Braga, elaborando um conjunto de recomendações para a CMB e para a tutela do Património Histórico.

Basta um único exemplo para justificar esta proposta da ASPA: do outro lado da Avenida Central, quase em frente aos Congregados, fica o edifício das Convertidas, que tem sido maltratado e que merece um projecto de valorização urgente.

Obviamente, o poder local deve procurar o apoio financeiro de fundos europeus, para projectos elaborados em consonância com o Governo e em diálogo com a sociedade civil.

Não há muito tempo reuniu-se em Braga, no Mosteiro de Tibães, na esplêndida Sala do Capítulo, o Conselho de Ministros do Governo de Portugal. Com muito aparato mediático. Com modéstia, lembramos ter sido a ASPA a entidade que mais lutou pela salvaguarda do Mosteiro, conseguindo que fosse adquirido pelo Estado (como é do conhecimento público e da tutela do património). Teria sido uma atitude louvável, o sr. Ministro da Cultura, no âmbito da deslocação a Braga, agendar uma reunião com a ASPA, para debater as questões do Património Histórico bracarense, tanto mais que a associação pediu a intervenção do Ministério da Cultura com vista à defesa do património bracarense.

A ASPA, mesmo que não agrade aos poderes, continuará a lutar pela defesa dos numerosos testemunhos da História de uma cidade milenar.

segunda-feira, 28 de agosto de 2023

ENTRE ASPAS: "Cidade ambientalmente sustentável. Uma prioridade política"


As agendas políticas têm de deixar de ter as temáticas associadas ao Território e ao Ambiente apenas como retórica e flor de lapela dos seus agentes. 

O planeamento urbano, a nível municipal e intermunicipal, pressupõe decisões integradas no que diz respeito ao uso do solo, aos rios, às áreas inundáveis, à vegetação ripícola (ribeirinha) que envolve as linhas de água e às zonas húmidas, aos parques verdes e corredores verdes, entre outros meios fundamentais para o desenvolvimento dos ecossistemas, a promoção da biodiversidade e o equilíbrio ecológico.

O Ambiente e o Território são, por isso, matéria que, cada vez com maior relevância, ocupa o leque de preocupações do cidadão melhor informado, mais responsável e exigente do bem-estar e da qualidade de vida, pensando sempre, também, no futuro. 

Importa ter presente que oito dos ODS - Objetivos do Desenvolvimento Sustentável -, definidos pela Assembleia Geral das Nações unidas até 2030, dizem respeito ao ambiente. Um diz respeito ao que se espera das cidades em termos de tomada de decisão e nível de compromisso com os objetivos comummente estabelecidos. Assim, decisores políticos e população em geral estão colocados perante desafios que, em conjunto, deveremos perseguir. Não é tão difícil assim, desde que haja vontade. A regeneração dos solos, das águas e do ar são focos a ter em constante presença. 

Conforme relembramos no entre aspas "Restaurar a Natureza na Europa: uma urgência", a aprovação, pelo Parlamento Europeu, da Lei de Restauro da Natureza, obriga os estados-membros a restaurar 20% do seu património natural terrestre e marinho, até 2030, e todos os habitats degradados até 2050. Em breve teremos a versão final da Lei e, então, Portugal deverá transferir para os normativos nacionais esse objetivo, e pôr em prática, no território nacional, decisões integradas relativamente ao uso do solo e à edificação, à área florestada, às linhas de água e sua envolvente, ao litoral e ao oceano, entre outros. 


A exemplo da tendência nacional, ainda que forçada por via legal, não deveria Braga procurar travar a expansão urbana arbitrária e tratar de se reestruturar e rever a forma de crescer, qualificando-se? Continuará a ter sentido ampliar a cidade no sentido do meio rural e da área florestada, destruindo solo agrícola e reduzindo solo permeável e áreas que são suporte à diversidade da vida animal e vegetal? Não deverá optar-se por planear, para essasa zonas, a urbanização que promova a menor ocupação de solo, com soluções arrojadas de construção em altura, edifícios que integrem área verde (jardins ou bosques verticais), libertando solo para criação de parques e corredores verdes, ligando a cidade aos rios e à área natural? A urbanização a realizar no âmbito do Plano de Urbanização das Sete Fontes poderia ser assumida como laboratório de experimentação.

Convém ter presente que uma cidade que promove a biodiversidade e seus habitats é, também, uma cidade que proporciona qualidade de vida a quem nela habita e que é capaz de contribuir para a adaptação às alterações climáticas, contrariando, através do planeamento urbano, o aumento de ondas de calor e de pluviosidade extrema, conforme previsto para as próximas décadas. 

Podíamos seguir exemplos de outras cidades, algumas na Europa e outras noutros continentes, por vezes com temperatura muito mais elevada e que, desde cedo, compreenderam que a nova construção, nas cidades, deve seguir um paradigma oposto ao das últimas décadas. Soluções construtivas em altura, com jardins e bosques verticais, articulados com corredores verdes que cruzam a cidade e facilitam o percurso, a pé ou de bicicleta, pelos seus habitantes e por quem nos visita. Área verde que promove a biodiversidade. 


Em 2012, Milão, em Itália, que muitos conhecem pela cidade antiga e seus monumentos, como a Piazza del Duomo, com a Catedral (Duomo) e as Galerias Vittorio Emanuele, optou pela reabilitação de uma zona degradada que transformou numa zona de elevada qualidade - residencial, de comércio, serviços e espaços de espetáculo -, com construção em altura que inclui bosques verticais (reflorestamento urbano), parques verdes, corredores verdes e zonas com água. Um projeto de arquitetura urbana que contribui para a regeneração do meio ambiente, na medida em que os bosques verticais aumentam a humidade do ar, absorvem CO2, favorecem o isolamento acústico,  a diminuição da temperatura nos meses mais quentes e uma maior luminosidade nos meses de inverno, bem como a atração de aves e insetos polinizadores, promovendo a biodiversidade. 


Singapura, na Ásia, foi mais arrojada ainda quando, em 2012, investiu na criação de zonas verdes – parques, reserva natural, estufas, corredores verdes, jardins botânicos e, ainda, as “árvores” tecnológicas que captam água da chuva e atraem insetos e aves -, articuladas com edifícios altos e com bosques verticais, no âmbito de um planeamento urbano exigente sob o ponto de vista arquitetónico e ambiental. É a cidade com maior densidade de árvores em zona urbana.


Em Paris, na outrora zona degradada de Clichy-Batignolles, foi construído um bairro habitacional ecossustentável, de grande qualidade arquitetónica, lado a lado com o novo parque Martin Luther King, sendo 60 por cento das habitações a custo controlado, comprovando a possibilidade de unir três aspetos indispensáveis nas cidades do presente: habitação social, proteção do ambiente e qualidade arquitetónica e urbanística. 


Também em 2012, Braga desenvolveu o projeto A Regenerar Braga, no âmbito do qual substituiu lajes antigas de granito por placas de granito industrial, transformando praças e ruas históricas em zonas impermeáveis e excessivamente quentes. Perdeu uma oportunidade para construir cidade, como era esperado, de acordo com as preocupações já existentes em matéria ambiental. 


O que nos reserva o futuro?

Braga vai manter formas de atuar do passado ou vai olhar em frente e começar a construir a cidade do futuro, sustentável, de qualidade e inclusiva?


Está em causa a casa comum (a que se refere o Papa Francisco na encíclica Laudato si`) e TODOS a temos de defender.


quarta-feira, 23 de agosto de 2023

GESTÃO DE MUSEUS E MONUMENTOS: tomadas de posição face às mudanças decididas pelo Governo

Desde que o Governo anunciou, no final de junho, alterações à tutela do património cultural português, foram variadas as tomadas de posição sobre o assunto. Os DL que procedem à criação da Museus e Monumentos, Entidade Pública Empresarial e do Património Cultural, Instituto Público, foram promulgados pelo Senhor Presidente da República, conforme divulgado no site da Presidência da República.

A ASPA pronunciou-se desfavoravelmente, junto do Senhor Ministro da Cultura e da Senhora Secretária de Estado da Cultura, a 5 de julho, tendo como ponto de partida a decisão do Governo relativamente ao Museu D. Diogo de Sousa e ao Museu dos Biscainhos. Essa tomada de posição, que não obteve resposta, foi divulgada no entre aspas publicado no Diário do Minho a 31 de julho.

Relembramos a petição em curso,  lançada por um grupo de cidadãos - https://peticaopublica.com/pview.aspx?pi=PT117143 - bem como artigos publicados sobre o assunto. Se ainda não assinou é o momento de o fazer,  reconhecendo que "a tutela municipal, recentemente anunciada pelo Ministério da Cultura, não poderá responder ao seu papel regional, de apoio à investigação e de garante de boas práticas no âmbito da Conservação e Restauro que importa prosseguir, apelando a que seja reequacionada esta decisão".

  O ICOMOS (Conselho Internacional dos Monumentos e Sítios), que é o órgão consultor da UNESCO para o Património Cultural, conforme a Convenção para o Património Mundial, foi auscultado após a apresentação dos DL 274 e 275/XXIII/2023, pelo Senhor Ministro da Cultura, no final de junho. O ICOMOS elaborou o respetivo Parecer, disponível no site do FÓRUM DO PATRIMÓNIO.

Consultar documento completo


Artigos publicados ...
  • A 2 de julho, do Senhor Presidente da Câmara Municipal de Braga; 
  • A 31 de julho, entre aspas publicado pela ASPA na sequência do e-mail enviado ao senhor Ministro da Cultura, a 5 de julho;
  • A 7 de agosto, do Professor João Pedro Cunha Ribeiro (Universidade de Lisboa);
  • A 9 de agosto, do Senhor Presidente da CCDR-N;
  • A 19 de agosto, de responsáveis por organismos e/ou organizações  no âmbito do Património Cultural; 
  • A 20 de agosto, dos Presidentes de municípios do Norte a quem foi atribuída a tutela de museus e monumentos: Braga, Bragança, Guimarães, Lamego e Miranda do Douro.
  • a 30 de agosto, entrevista à Diretora do Museu D. Diogo de Sousa

  1. 7 agosto

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terça-feira, 15 de agosto de 2023

ENTRE ASPAS: "RESTAURAR A NATUREZA NA EUROPA: uma urgência"

É sabido que as agendas políticas - local e nacional - não podem deixar de ter presentes assuntos relativos ao território que, durante as últimas décadas foram, no geral, ignorados. O planeamento urbano, a nível municipal e intermunicipal, pressupõe, por isso mesmo, decisões integradas no que diz respeito ao uso do solo, aos rios, às áreas inundáveis, à vegetação rípicola que envolve as linhas de água  e a as zonas húmidas, aos parques verdes e corredores verdes, entre outros meios fundamentais para o desenvolvimento dos ecossistemas e a promoção da biodiversidade.

O Ambiente e Território são, por isso, matéria que, cada vez com maior relevância, ocupa o leque de preocupações do cidadão melhor informado, mais responsável e exigente.

Importa ter presente que oito dos 17 ODS - Objetivos para o Desenvolvimento Sustentável (identificados na imagem) - definidos pela Assembleia Geral das Nações Unidas até 2030, dizem respeito ao Ambiente. 

Um deles diz respeito ao que se espera das cidades. em termos de tomadas de decisão e nível de compromisso com os objetivos comummente estabelecidos. Assim, tanto decisores políticos, como a população em geral estão (estamos) colocados perante desafios e atitudes que concorrem, simultaneamente, para o sucesso ou o fracasso dos desígnios que, em conjunto devemos perseguir. A regeneração dos solos, das águas e do ar são focos a ter em constante presença.

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Como contributo para o debate sobre o Ambiente a nível local, Catarina Afonso (bióloga, doutoranda) faz uma breve síntese da atuação da União Europeia no que diz respeito à Lei de Restauro da Natureza. 

Esperamos que este assunto mereça a atenção dos políticos locais em exercício, das forças partidárias com representação nos órgãos autárquicos e da população em geral. 

Está em causa o interesse de todos e TODOS o temos de defender.


RESTAURAR A NATUREZA NA EUROPA: uma urgência

Catarina Afonso (Bióloga)

"Quando exploramos os recursos naturais, diminuímos o espaço para a vida selvagem (os seus habitas). Ao longo das últimas décadas, espécies extinguiram-se, várias ficaram em perigo ou ameaçadas, os solos e os cursos de água foram sendo fortemente alterados e poluídos. Estamos já, segundo a comunidade científica, a viver a sexta extinção do planeta, a primeira desde que os humanos ocuparam a Terra.

A União Europeia pede aos seus estados-membros, desde há vários anos, que monitorizem e informem, a cada seis anos, sobre o estado dos seus habitats. Os últimos relatórios (com dados até 2018) revelam que o estado da biodiversidade europeia é alarmante: 81% dos habitats protegidos estão em mau estado de conservação. Entre os mais degradados, estão as zonas húmidas, as turfeiras e os habitats dunares. Para além disso, mais de metade das populações de peixes e anfíbios diminuíram durante a última década, uma em cada dez espécies de abelhas e borboletas está em risco de extinção, e cerca de 70% do solo europeu não é saudável. Em Portugal, 72% dos habitats estão em estado inadequado ou mau, e 80% tendem a degradar-se ainda mais se nada for feito para o evitar.

A degradação da biodiversidade europeia está tão avançada que a conservação e proteção da Natureza remanescente não é suficiente para travar a extinção de espécies, a nossa capacidade de produzir alimentos e evitar os piores impactos das alterações climáticas. De acordo com a Agência Ambiental Europeia, pelo menos 11.000 km2 de habitats precisam ser restaurados (recuperados activamente) e a área de habitats protegidos tem de ser aumentada de modo a preservar o funcionamento de cada tipo de habitat a longo prazo. Para além disso, a grande maioria das áreas de habitats protegidos existentes precisa ser restaurada para um bom estado. 

A meta de restaurar 15% dos ecossistema degradados da Europa, integrante na Estratégia para a Biodiversidade  2020 (adoptada em 2011), ficou por cumprir (em grande medida por ser uma meta voluntária). Reconhecendo isso, a Comissão Europeia propôs, em junho de 2022, um pacote legislativo com vista à obrigação dos estados-membros de restaurar 20% do seu património natural terrestre e marítimo, até 2030, e todos os habitats degradados até 2050. Note-se que, ainda assim, essa meta (20% dos habitats restaurados) é menor do que a acordada durante a Conferência da Biodiversidade de Montreal e no Quadro de Kunming-Montreal de 2019 (30% até 2030). Assim, e apesar de passar por um processo muito conturbado, o Parlamento Europeu aprovou, no passado dia 12 de julho, o Regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativo à Restauração da Natureza - a chamada Lei do Restauro da Natureza. A votação renhida (336 votos a favor, 300 contra e 13 abstenções), reflete a influência da oposição à Lei por parte de eurodeputados mais conservadores, pressionados pelos grandes lobbies ligados à indústria e à agricultura intensiva.

Esta é a primeira Lei europeia, em 30 anos, que visa a proteção da biodiversidade e Natureza, para além daquela que se encontra em áreas protegidas e/ou sob regime de proteção através da Diretiva Habitats de 1992 (que protege animais e plantas raras, ameaçadas ou endémicas, e cerca de 200 tipos de habitats raros), da Diretiva Aves de 2009 (que protege as espécies de aves selvagens nativas da União Europeia), e da Rede Natura 2000 (que mantém uma rede de áreas protegidas, com núcleos de proteção para espécies raras e ameaçadas e tipos de habitats raros). É também, a primeira lei inteiramente dedicada ao restauro da Natureza.

São várias as obrigações e objectivos da proposta original preparada pela Comissão Europeia que caíram por terra e, por essa razão, a Lei aprovada é considerada, por vários grupos ambientalistas, muito mais enfraquecida do que o pacote de 2021. Ficou de fora, por exemplo, o artigo sobre a promoção da biodiversidade em terrenos agrícolas, que incluía o restauro de turfeiras, um tipo de habitat essencial para o armazenamento de água e sequestro de carbono. Foram também eliminados o artigo referente ao direito fundamental de acesso à justiça e o artigo da obrigação de não deterioração dos habitats, foi suprimida a obrigação de manter nas florestas a madeira morta (essencial para a sobrevivência de várias espécies ameaçadas), o compromisso de recuperação natural dos habitats terrestres ficou limitado às áreas pré-existentes no âmbito da Rede Natura 2000, e os objetivos calendarizados ficaram dependentes de dados sobre a garantia da segurança alimentar a longo prazo (podendo levar a atrasos na implementação da Lei). Ainda assim, a aprovação da Lei do Restauro da Natureza é um passo importante, pelo menos em teoria, para recuperar certos ecossistemas terrestres e marinhos que foram sendo gravemente degradados, incrementando o sequestro de carbono na Europa, protegendo solos e água e pondo um travão ao alarmante declínio dos polinizadores.

A Lei do Restauro da Natureza segue agora para negociação entre o Parlamento, o Conselho e a Comissão Europeus, de onde sairá a versão final e vinculativa da Lei. Esperemos que, ao abrigo da nova Lei, a Europa e Portugal sejam capazes de restaurar a Natureza europeia, conciliando a proteção da biodiversidade e as nossas necessidades como humanos, pois é urgente enfrentar a dupla crise da biodiversidade e do clima, auxiliando a construção da resiliência da Europa."


P.S. Acrescentamos ao texto hiperligação para as diferentes diretivas europeias (ou informação sobre o assunto), de modo a facilitar a compreensão do processo que conduziu à necessidade da Lei do Restauro da Natureza.

domingo, 30 de julho de 2023

ENTRE ASPAS: "CIDADÃOS EM DEFESA DO MUSEU D. DIOGO DE SOUSA E DO MUSEU DOS BISCAINHOS Quando há erros é preciso corrigi-los!"

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A ASPA teve conhecimento das alterações anunciadas pelo Senhor Ministro da Cultura, relativamente ao modelo de gestão de museus e monumentos, na última semana de junho. 

De seguida auscultou pessoas com responsabilidades nessa área, no sentido de obter informação fidedigna; no dia cinco de julho enviou e-mail, ao Senhor Ministro da Cultura e à Senhora Secretária de Estado, que poderá ser consultado no Entre Aspas, ao lado.


OUTRAS TOMADAS DE POSIÇÃO...

 

1.    A petição “Em Defesa do Museu de Arqueologia D. Diogo de Sousa” que, ontem, tinha 1637 subscritores, desde o cidadão comum a  personalidades que se destacam - antigos ministros da cultura (do PSD e do PS), dirigentes de organismos do Estado, professores universitários e artistas – termina com a frase “os signatários entendem que a tutela municipal, recentemente anunciada pelo Ministério da Cultura, não poderá responder ao seu papel regional, de apoio à investigação e de garante de boas práticas no âmbito da Conservação e Restauro que importa prosseguir, apelando a que seja reequacionada esta decisão”.  

2.    A municipalização do Museu D. Diogo de Sousa e do Museu dos Biscainhos foi assunto tratado na reunião de Executivo Municipal, a 24 de julho, havendo unanimidade no sentido de rejeitar a transferência da tutela regional para o município.

  

Os DL 274/XXIII/2023 e DL 275/XXII/2023 foram aprovados em Conselho de Ministros na semana passada.

O primeiro transfere para a tutela do município o Museu D. Diogo de Sousa e o Museu dos Biscainhos (a Casa dos Biscainhos e Jardins têm classificação de âmbito nacional, como Imóvel de Interesse Público)

O segundo transfere para a tutela do município a Capela de S. Frutuoso de Montélios, classificada como Monumento Nacional, que a DRCN considera "um exemplar único da arte romano-bizantina no país e é considerado um dos mais fascinantes monumentos da alta idade medieval da península Ibérica".


Já assinou a Petição? Divulgou-a?

Espera-se que haja um movimento local de apoio à Petição1, assinando-a e divulgando-a junto de amigos e através das redes socais. Para que esta tomada de posição ganhe VOZ junto do Governo.

1 https://peticaopublica.com/?pi=PT117143 

 

segunda-feira, 17 de julho de 2023

ENTRE ASPAS: "As Rotas Portuguesas dos Jardins Históricos"

Fala-se em Jardins Históricos, mas será que toda a gente conhece o significado desta designação? 
A população que reside em Braga saberá quais os jardins classificados como Jardins Históricos e quais os que integram a Rota do Baixo Minho? 

Para esclarecer este assunto pedimos a colaboração do Arquiteto Paisagista Manuel Sousa, elemento da Direção da Associação Portuguesa de Jardins Históricos. 

Se quer saber mais sobre Jardins Históricos pode consultar o site da Associação Portuguesa de Jardins Históricos. 
Um Jardim Histórico
 

sábado, 8 de julho de 2023

ENTRE ASPAS "Abertura ao público do Castro de Sabroso, em Guimarães"

Foram inauguradas, no passado dia 25 de Junho, as obras de reabilitação do Castro de Sabroso, povoado castrejo localizado em São Lourenço de Sande, Guimarães, muito perto da Falperra, implantado numa pequena elevação do mesmo maciço dos "sacromontes".



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Como vários outros castros conhecidos desde cedo, Sabroso é Monumento Nacional desde 1910, e passou tormentos ao longo de décadas: a escavação parcial, a insustentabilidade da manutenção, o saque, o abandono dos campos e a tomada pela vegetação infestante. Não esquecido, porque sempre ali esteve e sempre nele se pensou, passou ao lado dos planos, projetos e planeamento do território das últimas décadas.


Alguns quilómetros para Oeste, em Braga, na freguesia de Guisande e São Pedro de Oliveira, outro Sabroso está ainda num ponto de indefinição. O Castro do Monte Redondo espera melhores dias, debaixo de um espesso eucaliptal e oculto por um mais denso emaranhado de destruições, processos, acusações e braços cruzados.

Foi escavado por Albano Belino no final do século XIX e inícios do século XX, seguindo instruções do amigo vimaranense Martins Sarmento, que lhe recomendava, em 1899 "Se lhe fosse fácil remover os entulhos para fora da 3.ª muralha, poderia considerar isso como uma grande felicidade. (...) ficando a exploração limpa e bonita, porque deixa à vista todas as construções sem montões de terra e pedregulho de permeio, como me sucedeu na Citânia.". Falava-lhe a voz da experiência de muitos anos em Briteiros.

Parte das ruínas foi colocada à vista e dali saíram vários elementos pétreos, com alguns exemplares decorados, conhecendo-se pelo menos três linhas de muralha. Classificado como Monumento Nacional, mantém-se na neblina dos dias, vigiando hoje apenas o troço da A3, que passa no sopé, e a bela vista da Veiga de Penso.

 

Braga, Capital Portuguesa da Cultura 2025, vai lembrar-se deste Castro?

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O Castro do Monte Redondo, situado nas freguesias de Guisande e São Pedro de Oliveira, em Braga, está classificado como Monumento Nacional.

No que diz respeito a este castro, a ASPA entende que se justifica não só preservá-lo, como também realizar uma intervenção minimalista, mas que fará a diferença. Daí que a ASPA tenha atuado no sentido de facilitar um acordo entre os proprietários dos terrenos e o Município de Braga, de modo a viabilizar um projeto idêntico ao que permitiu, agora, a abertura ao público do Castro de Sabroso. O processo ficou em aberto mas, até agora, não teve continuidade.

A salvaguarda e valorização do Castro seria uma mais-valia para Braga. Para além da salvaguarda de património cultural e valorização de mais um sítio arqueológico é de considerar a vista o vale, até Braga, que também é importante em termos turísticos.


Mais informação sobre o Castro do Monte Redondo:

quarta-feira, 21 de junho de 2023

ENTRE ASPAS "Os Serões Musicais: para conhecer o património musical de Braga dos finais do séc. XIX e início do séc. XX"


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Num momento em que Braga se candidatou a Capital Europeia da Cultura 27 e acabou por ser selecionada como Capital Portuguesa da Cultura em 25, a ASPA incluiu, no seu plano de atividades 2022/2023, Serões Musicais que relembraram um momento forte da cultura em Braga, quando o Teatro S. Geraldo e depois o Theatro Circo tinham uma programação regular de concertos e espectáculos músico-teatrais e o Coreto da Avenida, que semanalmente presenteava os bracarenses, com concertos protagonizados pelas bandas da Infantaria 8, Colégio de S. Caetano e Oficina de S. José. 

Percebemos que há uma curiosidade crescente sobre o património musical na cidade e, com a colaboração da nossa associada Elisa Lessa e de um conjunto de académicos e intérpretes reconhecidos, foram apresentados estudos em curso sobre esta temática e presenteámos o público com trechos musicais que evidenciaram o panorama musical bracarense há cerca de 100 anos, outrora motivo de deleite e convívio da população.

Mais informação sobre os Serões Musicais