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O azeite faz parte da vida e dieta dos povos do Mediterrâneo desde há muito tempo. A forma de fazer azeite mudou muito nas últimas décadas: a azeitona é colhida mais cedo, no estado de maturação ideal, e processada rapidamente; os lagares são limpos e têm temperatura controlada. Com esta modernização, os azeites portugueses passaram a ser reconhecidos internacionalmente pela sua qualidade: são azeites estáveis, aromáticos, apresentam baixos níveis de acidez e, sobretudo, estão isentos de defeitos sensoriais como ranço, tulha ou mofo.
Hoje temos à nossa disposição um alargado leque de opções de azeites, com diferentes qualidades, origens, preços e apresentações de embalagem. Mas como escolher? Sugiro que pondere os seguintes factores:
Qualidade. Quanto mais novo é o azeite, melhor é a sua qualidade. O tempo de consumo de cada azeite é definido pelo produtor (situa-se, em regra, entre os 9 e os 24 meses após extracção). Há azeites que se mantêm bons para consumo durante mais tempo (bem acondicionados e em recipientes escuros, para evitar a oxidação), mas vão perdendo qualidade e os seus aromas vão-se alterando. A acidez do azeite também influencia: quanto mais baixa for, maior qualidade tem o azeite, mais tempo tende a durar. O melhor azeite é o Virgem Extra, de acidez não superior a 0,8%. O seguinte é o Azeite Virgem, com acidez inferior a 2%. Existe depois o Azeite corrente, que contém mistura de azeite refinado. Estas duas últimas opções, mais baratas, podem ser usadas em fritos e refogados. Para utilizar em cru (em saladas, sopas e, claro, nos pratos de Natal), deve usar Virgem Extra.
Origem geográfica. Escolher azeites portugueses é uma forma de valorização da produção e economia nacional. A origem geográfica imprime ao azeite um carácter próprio: os de Trás-os-Montes tendem a ser mais intensos; os do Alentejo, mais suaves e de aroma fresco; os do Ribatejo, redondos e equilibrados; e os das Beiras terão perfis mais neutros. Mas até na mesma região, a diversidade de azeites é enorme e o melhor critério será sempre o paladar de cada um. Contudo, lembre-se que as suas escolhas como consumidor têm impacto directo nos territórios de origem dos produtos adquiridos. Se tiver preocupações de preservação do património, pode procurar azeites com Denominação de Origem Protegida (DOP). Não sendo sinónimo directo de qualidade superior, a qualificação DOP garante que o azeite foi produzido dentro de uma região geográfica delimitada, segundo uma série de práticas específicas, tradicionais e usando variedades de oliveiras locais.
Tipo de produção e práticas culturais. Em Portugal, a produção divide-se em três tipos de olival: o extensivo, o intensivo e o super-intensivo. Por um lado, os olivais extensivos e tradicionais têm árvores espaçadas, muitas vezes centenárias, conduzidas em sequeiro e, na maior parte das vezes, são explorados por empresas familiares de pequena dimensão. Por outro, os olivais intensivos e super-intensivos têm grande escala, grandes densidades de plantação, as árvores são muitas vezes regadas, e os processos são mecanizados. O super-intensivo, que tem vindo a ser instalado nos últimos anos no Alentejo, junto do Alqueva, é extremamente produtivo mas tem um impacto ambiental mais elevado.
Qualquer dos sistemas pode produzir azeites de elevadíssima qualidade, mas os seus efeitos ecológicos e sociais são diferentes. A escolha deverá privilegiar azeites produzidos com responsabilidade ambiental e social. Até há poucos anos, podíamos, por exemplo, desconfiar da sustentabilidade ambiental dos azeites provenientes de azeitonas de apanha nocturna. Mas desde 2019, após um estudo do INIAV que relatava que a apanha nocturna nos olivais era causa directa de morte de inúmeras aves que procuravam abrigo nas oliveiras durante a noite, que essas práticas foram banidas. Explorações que mantêm cobertura vegetal no solo, limitam o uso de pesticidas e herbicidas, fazem controlo biológico de pragas e gestão cuidadosa da água, apresentam impactes ambientais significativamente menores. Mas como este tipo de indicadores de sustentabilidade não aparecem, em regra, de forma explícita no rótulo, podemos, por questões de praticidade, procurar certificações de produção biológica, produção integrada ou qualificações regionais que incluam requisitos de boas práticas.
Ainda, se o objectivo for alinhar a escolha com a conservação do património natural e cultural, o azeite de olival extensivo e tradicional merece uma atenção especial. É nos olivais extensivos que se mantêm as variedades nacionais que conferem a genuinidade ao azeite português tradicional. Nos olivais intensivos e super-intensivos encontramos quase exclusivamente variedades de oliveiras estrangeiras adaptadas. Os olivais extensivos também mantêm mosaicos de paisagem onde cabem matos, pastagens, muros de pedra, linhas de água e pequenas hortas. Suportam maior diversidade de aves e insectos, usam menos químicos (ou nenhum) e ajudam a conservar solos frágeis em encostas e zonas de montanha. Para além disso, em muitas regiões, especialmente em zonas de montanha, o olival tradicional é uma atividade económica que mantém pessoas nos territórios rurais, sendo assegurada essencialmente por pequenas explorações e pequenas cooperativas.
Se o Natal é uma altura em que falamos de tradição, comunidade e solidariedade, escolher para a consoada (e para os restantes dias do ano) um azeite português de qualidade, produzido com respeito pela Natureza e proveniente do trabalho de empresas dos territórios rurais de baixa densidade é um bom exercício prático dessa lógica.
Catarina Afonso (Bióloga)










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