INTERVENÇÃO CÍVICA EM DEFESA DO PATRIMÓNIO

A ASPA criou este blogue em 2012, quando comemorou 35 anos de intervenção cívica.
Em janeiro de 2024 comemorou 47 anos de intervenção.
Numa cidade em que as intervenções livres dos cidadãos foram, durante anos, ignoradas, hostilizadas ou mesmo reprimidas, a ASPA, contra ventos e marés, sempre demonstrou, no terreno, que é verdadeiramente uma instituição de utilidade pública.
Numa época em que poucos perseguem utopias, não queremos descrer da presente e desistir do futuro, porque acreditamos que a cidade ideal, "sem muros nem ameias", ainda é possível.

quarta-feira, 8 de novembro de 2023

ENTRE ASPAS: "Percevejo asiático - o novo “inquilino” indesejado"

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Desde meados de Setembro, moradores de vários pontos da cidade têm vindo a deparar-se com a presença de “intrusos” nas suas varandas, janelas e até dentro de casa. Trata-se do percevejo Halyomorpha halys, de nome comum percevejo marmoreado castanho ou percevejo asiático.

O percevejo marmoreado castanho é originário do Oeste Asiático, mas tem vindo a expandir-se a outros continentes. Foi detectado nos anos 90, nos EUA, estando hoje presente em todos os Estados do país, no Canadá, e no Chile. Na Europa, as primeiras intercepções de Halyomorpha halys datam de 2004, na Suíça e Liechtenstein. Passados poucos anos, espalhou-se por Itália (2007), Alemanha e Grécia (2011), França (2012) e Espanha (2016). Actualmente encontra-se praticamente em toda a Europa, tendo sido detectado pela primeira vez em Portugal no início de 2019, por um kiwicultor de Pombal.

Este insecto pertence à ordem Hemiptera, um grupo que inclui percevejos, afídeos e cigarras, e tem cerca de 2000 espécies em Portugal. Os percevejos Halyomorpha halys adultos são castanhos marmoreados, medem entre 12 a 17 milímetros de comprimento, têm duas bandas claras nas antenas e veios escuros nas extremidades das asas. Por estas características, são muitas vezes confundidos com a espécie Rhaphigaster nebulosa, um percevejo europeu e comum em Portugal, sugador de seiva de plantas como os choupos ou aveleiras.

O Halyomorpha halys é fitófago, ou seja, alimenta-se de plantas, picando e sugando os nutrientes de frutos, folhas, rebentos e até dos caules. Este percevejo não constitui ameaça a humanos ou animais (não morde, não pica, nem transmite doenças). Não deve ser confundido com o percevejo de cama (Cimex lectularius), insecto achatado muito pequeno (5 a 7 milímetros) que se alimenta de sangue humano, e que foi noticiado por causar problemas de saúde pública em Paris recentemente.

A grande ameaça que o Halyomorpha halys constitui prende-se com o facto de ser altamente polífago, ou seja, é capaz de se alimentar de inúmeras plantas, incluindo várias culturas economicamente relevantes no país: maçã, pêra, cereja, pêssego, ameixa, uva, laranja, tomate, feijão, milho, kiwi, pimento, frutos vermelhos, citrinos, entre outras. As perdas de produção agrícola podem ser bastante graves, uma vez que, ao alimentar-se, o percevejo pode provocar cicatrizes, depressões, deformações, descolorações nos produtos agrícolas, inviabilizando a sua comercialização. Só em 2010, o Halyomorpha halys causou prejuízos de mais de 37 milhões de dólares em pomares de macieiras no Oeste dos EUA. Na Europa, um dos países onde a sua presença tem causado mais preocupação é Itália, onde é considerado uma das maiores pragas de pomares frutícolas, causando avultados prejuízos nas produções.

O percevejo asiático é capaz de se reproduzir muito rapidamente em climas favoráveis como o de Portugal. Consegue também dispersar-se facilmente através do vôo (podendo voar 5km ou mais, por dia), mas também “à boleia”, em contentores, veículos e até malas de viagem. Assim, após poucos anos sem se fazer notar em Portugal, esta espécie foi-se reproduzindo e estabelecendo populações no país. Este ano, e particularmente agora com a chegada de temperaturas mais baixas, estão a ser identificadas inúmeras ocorrências da presença de Halyomorpha halys em ambiente doméstico não apenas em Braga, mas em todo o país. Este facto tem a ver com o comportamento de procura de abrigo por parte do percevejo para passar os meses mais frios. Após a sua fase activa e de reprodução durante os meses quentes, o percevejo asiático procura, a partir de Setembro, um lugar onde possa permanecer em diapausa (um estado de “hibernação” que permite sobreviver ao inverno sem alimento). Nessa altura, os adultos agregam-se (por vezes em grandes quantidades) em zonas sombrias e em estruturas, como barracões, armazéns, frechas de janelas, portas, veículos, podendo atravessar fissuras de apenas 7 milímetros. A sua presença não apresenta qualquer risco para os humanos ou animais. No início da primavera, quando as temperaturas aumentam, saem da diapausa, abandonam os abrigos e retomam a alimentação e reprodução.

Por ser uma espécie invasora, os cidadãos podem e devem matar os percevejos asiáticos com que se deparem, depois de confirmar que se trata de Halyomorpha halys. O esmagamento liberta um odor nauseabundo e alguns repelentes de insectos podem não ser muito eficazes. O ideal será manter as janelas fechadas ou colocar redes nas mesmas, para evitar a entrada dos percevejos na sua habitação. Poderá ainda colocar uma bacia com água e detergente na varanda ou parapeito, onde os insectos vão beber água e para onde poderá também varrê-los, acabando por ficar presos e morrer por afogamento, sem libertar maus odores.

Catarina Afonso (bióloga), com colaboração do FLOWer LAB, CEF, Universidade de Coimbra

Identificar e registar:

Em 2018, kiwicultores da zona Oeste e cientistas do FLOWer Lab do Centro de Ecologia Funcional da Universidade de Coimbra (CEF-UC) criaram conteúdos informativos sobre o Halyomorpha halys, que estão disponíveis no grupo “Percevejo asiático (Halyomorpha halys) PT” no Facebook. Com o aumento do número de ocorrências detectadas este ano, recomendam que os cidadãos submetam o registo fotográfico dos insectos (com dados do local e data) na plataforma inaturalist.org, para permitir o acompanhamento desta nova espécie invasora em Portugal.

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