INTERVENÇÃO CÍVICA EM DEFESA DO PATRIMÓNIO

A ASPA criou este blogue em 2012, quando comemorou 35 anos de intervenção cívica.
Em janeiro de 2023 comemorou 46 anos de intervenção.
Numa cidade em que as intervenções livres dos cidadãos foram, durante anos, ignoradas, hostilizadas ou mesmo reprimidas, a ASPA, contra ventos e marés, sempre demonstrou, no terreno, que é verdadeiramente uma instituição de utilidade pública.
Numa época em que poucos perseguem utopias, não queremos descrer da presente e desistir do futuro, porque acreditamos que a cidade ideal, "sem muros nem ameias", ainda é possível.

segunda-feira, 28 de agosto de 2023

ENTRE ASPAS: "Cidade ambientalmente sustentável. Uma prioridade política"


As agendas políticas têm de deixar de ter as temáticas associadas ao Território e ao Ambiente apenas como retórica e flor de lapela dos seus agentes. 

O planeamento urbano, a nível municipal e intermunicipal, pressupõe decisões integradas no que diz respeito ao uso do solo, aos rios, às áreas inundáveis, à vegetação ripícola (ribeirinha) que envolve as linhas de água e às zonas húmidas, aos parques verdes e corredores verdes, entre outros meios fundamentais para o desenvolvimento dos ecossistemas, a promoção da biodiversidade e o equilíbrio ecológico.

O Ambiente e o Território são, por isso, matéria que, cada vez com maior relevância, ocupa o leque de preocupações do cidadão melhor informado, mais responsável e exigente do bem-estar e da qualidade de vida, pensando sempre, também, no futuro. 

Importa ter presente que oito dos ODS - Objetivos do Desenvolvimento Sustentável -, definidos pela Assembleia Geral das Nações unidas até 2030, dizem respeito ao ambiente. Um diz respeito ao que se espera das cidades em termos de tomada de decisão e nível de compromisso com os objetivos comummente estabelecidos. Assim, decisores políticos e população em geral estão colocados perante desafios que, em conjunto, deveremos perseguir. Não é tão difícil assim, desde que haja vontade. A regeneração dos solos, das águas e do ar são focos a ter em constante presença. 

Conforme relembramos no entre aspas "Restaurar a Natureza na Europa: uma urgência", a aprovação, pelo Parlamento Europeu, da Lei de Restauro da Natureza, obriga os estados-membros a restaurar 20% do seu património natural terrestre e marinho, até 2030, e todos os habitats degradados até 2050. Em breve teremos a versão final da Lei e, então, Portugal deverá transferir para os normativos nacionais esse objetivo, e pôr em prática, no território nacional, decisões integradas relativamente ao uso do solo e à edificação, à área florestada, às linhas de água e sua envolvente, ao litoral e ao oceano, entre outros. 


A exemplo da tendência nacional, ainda que forçada por via legal, não deveria Braga procurar travar a expansão urbana arbitrária e tratar de se reestruturar e rever a forma de crescer, qualificando-se? Continuará a ter sentido ampliar a cidade no sentido do meio rural e da área florestada, destruindo solo agrícola e reduzindo solo permeável e áreas que são suporte à diversidade da vida animal e vegetal? Não deverá optar-se por planear, para essasa zonas, a urbanização que promova a menor ocupação de solo, com soluções arrojadas de construção em altura, edifícios que integrem área verde (jardins ou bosques verticais), libertando solo para criação de parques e corredores verdes, ligando a cidade aos rios e à área natural? A urbanização a realizar no âmbito do Plano de Urbanização das Sete Fontes poderia ser assumida como laboratório de experimentação.

Convém ter presente que uma cidade que promove a biodiversidade e seus habitats é, também, uma cidade que proporciona qualidade de vida a quem nela habita e que é capaz de contribuir para a adaptação às alterações climáticas, contrariando, através do planeamento urbano, o aumento de ondas de calor e de pluviosidade extrema, conforme previsto para as próximas décadas. 

Podíamos seguir exemplos de outras cidades, algumas na Europa e outras noutros continentes, por vezes com temperatura muito mais elevada e que, desde cedo, compreenderam que a nova construção, nas cidades, deve seguir um paradigma oposto ao das últimas décadas. Soluções construtivas em altura, com jardins e bosques verticais, articulados com corredores verdes que cruzam a cidade e facilitam o percurso, a pé ou de bicicleta, pelos seus habitantes e por quem nos visita. Área verde que promove a biodiversidade. 


Em 2012, Milão, em Itália, que muitos conhecem pela cidade antiga e seus monumentos, como a Piazza del Duomo, com a Catedral (Duomo) e as Galerias Vittorio Emanuele, optou pela reabilitação de uma zona degradada que transformou numa zona de elevada qualidade - residencial, de comércio, serviços e espaços de espetáculo -, com construção em altura que inclui bosques verticais (reflorestamento urbano), parques verdes, corredores verdes e zonas com água. Um projeto de arquitetura urbana que contribui para a regeneração do meio ambiente, na medida em que os bosques verticais aumentam a humidade do ar, absorvem CO2, favorecem o isolamento acústico,  a diminuição da temperatura nos meses mais quentes e uma maior luminosidade nos meses de inverno, bem como a atração de aves e insetos polinizadores, promovendo a biodiversidade. 


Singapura, na Ásia, foi mais arrojada ainda quando, em 2012, investiu na criação de zonas verdes – parques, reserva natural, estufas, corredores verdes, jardins botânicos e, ainda, as “árvores” tecnológicas que captam água da chuva e atraem insetos e aves -, articuladas com edifícios altos e com bosques verticais, no âmbito de um planeamento urbano exigente sob o ponto de vista arquitetónico e ambiental. É a cidade com maior densidade de árvores em zona urbana.


Em Paris, na outrora zona degradada de Clichy-Batignolles, foi construído um bairro habitacional ecossustentável, de grande qualidade arquitetónica, lado a lado com o novo parque Martin Luther King, sendo 60 por cento das habitações a custo controlado, comprovando a possibilidade de unir três aspetos indispensáveis nas cidades do presente: habitação social, proteção do ambiente e qualidade arquitetónica e urbanística. 


Também em 2012, Braga desenvolveu o projeto A Regenerar Braga, no âmbito do qual substituiu lajes antigas de granito por placas de granito industrial, transformando praças e ruas históricas em zonas impermeáveis e excessivamente quentes. Perdeu uma oportunidade para construir cidade, como era esperado, de acordo com as preocupações já existentes em matéria ambiental. 


O que nos reserva o futuro?

Braga vai manter formas de atuar do passado ou vai olhar em frente e começar a construir a cidade do futuro, sustentável, de qualidade e inclusiva?


Está em causa a casa comum (a que se refere o Papa Francisco na encíclica Laudato si`) e TODOS a temos de defender.


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